Título: Grande como poucos o foram
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Fonte: Jornal do Brasil, 04/04/2005, Internacional, p. A8

Se vingar a sugestão que corre no Vaticano de adicionar o título ''o Grande'' ao nome papal de Karol Wojtyla, João Paulo II será o terceiro pontífice na história a receber a nomenclatura, junto com Gregório I e Leão I. Os dois são considerados os mais importantes da antiguidade. Leão nasceu em local e data indefinidos e morreu em 11 de novembro de 461. Num período em que o Império Romano do Ocidente enfrentava sua queda e a Igreja Católica estava fundida ao Estado, a maior tarefa era garantir a unidade.

Acredita-se que Leão seja original da Toscana. No pontificado de Sisto III (422-40), o padre Leão foi enviado à Gália pelo imperador Valentiniano III para resolver uma disputa entre Aëtius, chefe militar da província, e o magistrado Albinus. O papa faleceu durante a negociação, em 19 de agosto de 440. Ao retornar, Leão foi indicado em 29 de setembro para o papado. Seu pontificado duraria 21 anos, fortalecendo a instituição e lutando contra as heresias, em especial os seguidores de Pelágio, que negavam a salvação pela ressurreição de Cristo e o pecado original.

O papa usou sua influência na Gália para aproximar os bispos locais com Roma, mas encontrou a resistência de São Hilário de Arles. Em 445, Valentiniano III publicou um edital, determinando a primazia do bispo de Roma sobre toda a igreja. Além de promover a união do catolicismo romano no Leste e Oeste, Leão o Grande também defendeu a capital. Em 452, se encontrou pessoalmente com Átila, o rei dos Hunos, que devastara o Norte da península. O pontífice conseguiu a retirada e evitou a invasão. Três anos depois, a cidade foi ocupada pelo vândalo Genserico, mas o papa evitou a morte dos cidadãos e a destruição do patrimônio. São Leão o Grande morreu em 10 de novembro de 461. Seu corpo está na basílica de São Pedro, embaixo de um altar dedicado a ele.

Já Gregório o Grande nasceu em 540, em Roma. Filho de pais ricos (sua mãe, Santa Sílvia, é padroeira das grávidas), sabe-se que em 573 era funcionário da prefeitura - importante mas desprovida de poder. Um ano depois tornou-se monge, dando suas posses em Roma e na Sicília para a criação de sete mosteiros. Por três anos viveu recluso no mosteiro de Santo André, em Roma, que fora sua residência. Em 578, o papa Bento I nomeou-o como um dos sete padres da cidade, contra a sua vontade. Na primavera de 579, o papa Pelágio II o enviou à Bizâncio, para mediar a proteção do imperador do Oriente, Tiberius, contra a invasão dos lombardos. Por seis anos, o padre se alternou entre a cidade e Constantinopla e escreveu seu comentário sobre o Livro de Jó, que se tornou popular durante a Idade Média.

A missão política foi um desastre, mas o ensinou que não havia chance de comunhão entre os impérios ocidental e oriental - importante lição para seu papado. Em 585, Gregório voltou ao monastério, tornando-se secretário pessoal do papa. Quatro anos depois, Roma foi inundada, destruindo os cereais estocados e trazendo doenças. Em 590, Pelágio II morreu e Gregório seria o sucessor natural. Mas negou a oferta, sabendo que teria que deixar a calma do mosteiro, e enviou uma carta ao imperador Maurício, interceptada pelo prefeito de Roma, Germanus.

Com o agravamento da peste na cidade, Gregório convocou uma procissão que se iniciaria nas sete regiões de Roma e se encontraria na Basílica da Virgem Abençoada. Deu certo. Diz a lenda que o arcanjo Miguel apareceu, e com sua espada acabou com a praga. Em homenagem, o mausoléu de Hadrian passou a se chamar Castel Sant'Angelo, hoje uma das casas papais de verão. Depois da procissão, Gregório assumiu em 590 e seu pontificado foi marcado pela saúde débil e trabalho intenso. Ele publicou o Liber pastoralis curae, por séculos o livro-guia do episcopado.

Como papa, Gregório I usou a Igreja para trazer alimento a Roma e instaurou as Estações, até hoje adotadas na missa. Em 595, realizou o primeiro sínodo, com novas mudanças. Também foi o primeiro grande administrador da Igreja, expandindo muito suas propriedades. E negociou a paz com os lombardos, afirmando a teoria que Estado e igreja trabalhavam em esferas diferentes, mas cooperativas. Como João Paulo II, Gregório foi missionário, aproximando as províncias da Espanha, Gália e África, afirmando o poder de Roma à frente da Igreja Católica. Faleceu em 604.