Título: Café especial esquenta exportação
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 04/04/2005, Economia & Negócios, p. A19

Embora corresponda a 2% do volume negociado, grão selecionado garante 40% da receita com a venda externa do produto

Maior exportador mundial e segundo maior consumidor de café do planeta, o Brasil experimenta o crescimento de um novo filão no mercado do produto. Nos últimos anos, vem tomando corpo nas vendas externas do país a negociação envolvendo cafés especiais. No mercado internacional, a variedade consegue preços, na média, de 30% a 35% superiores aos do café tradicional e atrai um número cada vez maior de compradores.

No ano passado, das cerca de 23 milhões de sacas exportadas, cerca de 500 mil foram de cafés especiais. Parece pouco, mas nos últimos anos o segmento experimenta crescimento entre 15% e 20% ao ano, enquanto a média de expansão do mercado tradicional é de apenas 1% a cada 12 meses.

O diretor-geral do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Guilherme Braga, estima que, nos últimos 12 meses terminados em fevereiro, a receita obtida com as vendas dos lotes selecionados tenham representado cerca de US$ 850 milhões para o saldo da balança comercial brasileira em um universo total de US$ 2,16 bilhões exportados pelo país em café verde e solúvel no período.

O mercado de cafés especiais tomou impulso a partir dos anos 80 em decorrência de uma exigência do consumidor, que passou a dar valor a um produto com origem rastreável, fabricado em fazendas que respeitam determinados requisitos de respeito ao meio ambiente e seguem orientações internacionais em relação ao mercado de trabalho e enfrentam custos em média 10% a 20% superiores aos tradicionais.

- As empresas que compram este tipo de produto vão vender para um consumidor exigente, em elegantes cafeterias na 5ª Avenida, em NovaYork, em xícaras especiais de porcelana pura. Atualmente, os especiais crescem muito devido a uma demanda de consumidores que buscam uma mercadoria diferenciada - afirma Braga.

No Brasil, a Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) conta com 52 fabricantes associados e mais 44 em processo de filiação. Os produtos oriundos das fazendas que seguem as normas de produção da BSCA recebem um selo de comprovação que permite o rastreamento de qualquer embalagem adquirida pelo consumidor.

- A certificação tira a responsabilidade sobre a qualidade do produto do ponto de venda e a repassa diretamente para o produtor, aumentando a transparência da cadeia produtiva e garantindo um alto grau de sofisticação das amostras, em um processo semelhante ao que já está consolidado no mercado de vinhos - explica José Francisco Pereira, presidente da BSCA.

A certificação, da BSCA ou de outras associações certificadoras, não é obrigatória, no entanto, para uma empresa estampar nas suas embalagens os nomes ''especial'' ou ''gourmet'', que determinam a produção diferenciada dos lotes de café usados na fabricação. Sérgio Tristão, que controla a Tristão Companhia de Comércio Exterior, maior exportadora de café verde do Brasil, com cerca de 9% do total vendido ao exterior em 2004, concorda que a demanda mundial por cafés selecionados tem crescido de forma consistente, mas revela que, apesar de não exigir dos produtores com quem trabalha a certificação dos lotes selecionados, negocia parte das exportações como café especial.

- Atuamos desde 1960 vendendo café para o exterior e temos laços estreitos com nossos compradores, que acreditam quando garantimos que um produto é especial - diz ele, com a autoridade de quem, no ano passado, foi responsável por embarcar 2,4 milhões de sacas para outros países, conseguindo receitas em torno de R$ 520 milhões.

Sérgio Tristão, no entanto, não descarta a possibilidade de, no futuro, exigir selos de garantia de entidades como a BSCA para os produtores dos grãos selecionados.

- A partir do momento que nossos compradores exigirem que vendamos embalagens certificadas, cobraremos dos produtores a presença do selo. Teria inclusive prazer em estampar o certificado no produto - garante.

Um dos produtores já associados à BSCA é Gabriel Dias, proprietário da Bourbon Special Tea Coffee, situada no município de São Sebastião da Grama, na divisa dos estados de São Paulo e Minas Gerais, na Mogiana, região conhecida pela qualidade dos cafés que produz. Ele explica que a fazenda trabalha com cafés especiais desde 1992 e que a entrada para a BSCA aconteceu em 2001.

- A adaptação às regras rígidas de produção levaram seis meses e custaram R$ 99 mil, mas valeram a pena. Nesse nicho de mercado, no entanto, é preciso ter paciência, pois a venda não é imediata e a certificação é mais um passo para a conquista do mercado. Os compradores são conservadores - observa.

Dias garante que, sem o certificado, os ganhos obtidos na exportação seriam menores. A fazenda exporta 85% das 10 mil a 15 mil sacas que produz anualmente de café. A produção de 5 mil a 8 mil sacas especiais, entretanto, é destinada quase que integralmente ao mercado externo.

- Temos uma marca especial, a Spress Café, vendida inclusive no mercado interno, mas o consumidor brasileiro ainda não está disposto a pagar mais por um produto de maior qualidade - lamenta.

Em média, um quilo de café especial torrado e moído custa entre R$ 25 e R$ 32, contra preços que oscilam entre R$ 8 e R$ 11 do produto tradicional, o que explica em parte o baixo consumo nacional do país em relação ao mercado que movimenta cerca de 6 milhões de sacas por ano, principalmente para o Japão e Estados Unidos e Europa.