Correio Braziliense, n. 20632, 18/11/2019. Política, p. 4

Atuação de Toffoli divide opiniões

Luiz Calcagno


Especialistas, entidades de classe e parlamentares se dividem a respeito do pedido do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, de acessar dados da Unidade de Inteligência Financeira (UIF). O ministro solicitou cópias de todos os relatórios de Inteligência Financeira e Representações Fiscais para Fins Penais do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) dos últimos três anos. Até a próxima quarta, o assunto ainda deve render. Além de acessar informações de cerca de 600 mil pessoas jurídicas e físicas, os relatórios mostram quem estava on-line e que informações investigaram.

Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho está entre os críticos da medida e afirma, entre outras coisas, que o magistrado põe em risco a imagem do Brasil no combate internacional à lavagem de dinheiro. Para ele, o ministro se excede ao solicitar um relatório tão vasto. Mas, alguns especialistas veem a medida como uma forma de coibir abuso no compartilhamento de informações sigilosas entre a UIF e o Ministério Público. Do mesmo modo, no Congresso, oposição e governistas tendem a discordar. Os primeiros veem uma medida necessária, e os demais, como autoritarismo.

“Com o devido respeito ao ministro, esse processo todo é um acúmulo de equívocos”, alerta Robalinho. “O processo original, do qual ele é relator, diz respeito à Receita Federal e foi ampliado de maneira duvidosa. A discussão (que está sendo travada) não é a mesma do processo originário”, avalia. Para ele, o acesso aos relatórios não é necessário para o julgamento na próxima quarta. “O que o presidente solicitou foi uma massa de informações gigantesca. O Coaf recebe todos os tipos de operações suspeitas. E, na Receita Federal, todas as situações em que a Receita termina uma operação e identifica a possibilidade de sonegação, encaminha para o MP. Isso era feito há décadas”, afirma.

 

Criminalista apoia

Professor de direito e advogado criminalista, Luis Henrique Machado discorda. “O ministro Toffoli tomou duas decisões. Na primeira, ele determinou a suspensão em todo o território nacional dos processos que tiveram origem em dados fiscais e bancários sigilosos de contribuintes compartilhados sem autorização judicial. O controle dessas medidas investigativas, por meio do Poder Judiciário, protege direitos de todo e qualquer cidadão, principalmente, contra eventuais atos arbitrários dos órgãos de controle”, argumenta.

Para ele, com acesso aos documentos, será possível esclarecer se ocorreu algum abuso no compartilhamento de informações sigilosas entre o antigo Coaf e o Ministério Público. “Tecnicamente, as duas decisões são acertadas. Dados sigilosos dos cidadãos não podem ser objeto de investigação sem prévia autorização judicial, por respeito ao princípio de reserva de jurisdição. A segunda, se o Poder Judiciário pode autorizar a própria quebra dos dados, não haveria problema em requisitar os dados sigilosos ao Banco Central, mesmo de ofício, para fins de controle de eventuais irregularidades”, afirma.

O senador Cid Gomes (PDT-CE) vai com o criminalista. “Primeiro se comete o crime, depois se investiga”, diz. “O MP só deveria ter acesso (às informações) com autorização do judiciário. Não tenho procuração para defender Toffoli, mas, pelo que tenho ouvido, ele não acessou as informações, que não podem ser usadas para fins de bisbilhotagem”, pondera. Já a Juíza Selma (Podemos-MT) fica com Robalinho. “Foi uma violação indevida de dados. E ninguém sabe quem foi atingido com isso. Isso é muito grave e exige providências urgentes por parte do próprio Senado.Teremos reunião do grupo Muda Senado no meu gabinete para decidir o que pode ser feito a respeito”, avisa.