Correio Braziliense, n.20578, 25/09/2019. Política. p.5

Governo é derrotado no congresso 

Jorge Vasconcellos 
Simone Kafruni 



O Congresso Nacional impôs uma derrota ao governo e derrubou, na noite de ontem, 18 dos 33 vetos feitos pelo presidente Jair Bolsonaro ao texto da Lei de Abuso de Autoridade aprovado pelo Legislativo, que restringe a ação de juízes, promotores e policiais. Agora, o presidente Jair Bolsonaro terá 48 horas para promulgar a lei. Caso não o faça dentro do prazo, o procedimento ficará a cargo do Presidente do SenadoDavi Alcolumbre (DEM-AP).

A sessão do Congresso foi antecipada em uma semana, por iniciativa de Alcolumbre. A decisão foi tomada após a operação da Polícia Federal (PF), na semana passada, que cumpriu mandados de busca e apreensão no gabinete do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), e do filho dele, o deputado Fernando Coelho Filho (DEM-PE). Ambos são acusados de terem recebido propina durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, período em que o atual senador foi ministro da Integração Nacional.

A ação da PF, autorizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), provocou uma crise nas relações entre os Poderes, que teve consequências para a tramitação de projetos importantes para o governo no Legislativo. Ontem mesmo, o Senado adiou por uma semana a votação da proposta de Reforma da Previdência, considerada essencial para equilibrar as contas públicas (veja na página seis).

No último fim de semana, o Presidente do Senado telefonou para outros parlamentares na tentativa de obter acordo para a rejeição dos vetos à lei aprovada pelo Congresso em agosto e sancionada pelo presidente Bolsonaro, no início de setembro. O senador Marcos Rogério (DEM-RO), que ajudou Alcolumbre na articulação pela derrubada, disse que Bolsonaro não foi bem assessorado nas discussões sobre os vetos, muitos dos quais foram sugeridos pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. “O presidente foi mal orientado ao vetar alguns trechos. Não acredito, por exemplo, que ele concorde com prisão sem embasamento legal. É um absurdo”, afirmou o parlamentar.

O deputado Ricardo Barros (PP-PR), que relatou o projeto na Câmara, comemorou a derrubada dos vetos e usou de ironia ao se referir ao ministro do STF que autorizou a operação da PF no Congresso. “Foi muito melhor do que eu esperava. Obrigado, Barroso”, afirmou. “Os parlamentares votaram, trazendo a esta Casa protagonismo no sentido de que todos os cidadãos são iguais perante a lei, e os inimputáveis não poderão mais se esconder pela falta de uma regulamentação”, disse.

A derrubada dos vetos, porém, desagradou aos integrantes mais fiéis da base do governo. O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), admitiu que a operação da PF influenciou no resultado da votação. “Lamentavelmente, isso pesou. Quem está insatisfeito com a ação contra ele (Fernando Bezerra) deveria assinar a CPI dos Tribunais Superiores, e não votar essa lei que dificulta o combate ao crime. Hoje, é dia de festa no mundo do crime”, lamentou o parlamentar, favorável à manutenção de todos os vetos.

Entre os vetos derrubados, está o que permite ao ofendido entrar com uma ação penal privada contra a autoridade, se o Ministério Público se omitir. Outros pontos que voltarão a valer são os que tornam crime de abuso de autoridade a decretação, substituição ou relaxamento de prisão considerada irregular; constranger preso a produzir prova contra si; insistir em interrogatório de pessoa que invoque o exercício do direito ao silêncio ou a presença de advogado; deixar a autoridade de se identificar ao preso; impedir a comunicação com advogado; e negar acesso de advogado aos autos.

Após a apreciação, Alcolumbre decidiu encerrar a sessão do Congresso e convocou outra para hoje, às 16h. O Legislativo ainda precisa avaliar, em sessão conjunta da Câmara e do Senado, outros vetos, como o da franquia de bagagem nos voos domésticos, para limpar a pauta, e votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020, apresentada ontem pela quarta vez ao Congresso, sem ter sido votada.

Frase

“Lamentavelmente, isso pesou. Quem está insatisfeito com a ação contra ele (Fernando Bezerra) deveria assinar a CPI dos Tribunais Superiores, e não votar essa lei que dificulta o combate ao crime. Hoje, é dia de festa no mundo do crime”

Senador Major Olímpio, Líder do PSL no Senado