Correio Braziliense, n. 20630, 16/11/2019. Política, p. 4

Toffoli bate de frente com o MPF

Renato Souza


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, negou, na noite de ontem, um pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, para que fosse revogada a decisão que determina o envio à Corte de todos os Relatórios de Inteligência Financeira (RIF) e das Representações Fiscais para Fins Penais (RFFP), emitidos nos últimos três anos pela Unidade de Inteligência Financeira (antigo Coaf) e pela Receita Federal. A decisão coloca em choque as posições do Ministério Público Federal e do Supremo. No documento enviado ao tribunal, Aras declarou que o acesso aos dados coloca “em risco informações privadas”.

Além de negar o pedido de Aras, Toffoli determinou que a Receita Federal informe, até as 18h de segunda-feira, quais órgãos públicos estavam cadastrados para receber os relatórios de inteligência financeira. O presidente do STF também destacou ser “apropriado” que o MPF comunique ao tribunal “quantos e quais” de seus membros são cadastrados no sistema para receber as informações citadas e quantos a instituição solicitou.

No conteúdo enviado ao Supremo há informações detalhadas das movimentações financeiras de pelo menos 600 mil pessoas, entre cidadãos sem vínculo com o poder público e autoridades do Executivo, Legislativo e Judiciário. De acordo com Toffoli, porém, os dados financeiros já estavam disponíveis à Justiça, portanto, seu acesso pelo Supremo não traz prejuízos. “No que concerne às informações emanadas da Receita Federal do Brasil, destaco que os documentos solicitados já foram disponibilizados, em forma de representações fiscais para fins penais (RFFP), a todo o Sistema de Justiça brasileiro para adoção de medidas cabíveis, ou seja, à Autoridade Policial, ao Ministério Público e ao próprio Poder Judiciário”, afirmou um trecho da decisão.

O presidente do Supremo afirma que a Corte não teve acesso às informações. “O STF não realizou o cadastro necessário ou teve acesso aos relatórios de inteligência”, frisou Toffoli. Ainda de acordo com o ministro, não é invasivo que o tribunal receba as informações solicitadas. “Não se deve perder de vista que este processo, justamente por conter em seu bojo informações sensíveis, que gozam de proteção constitucional, tramita sob a cláusula do segredo de Justiça, não havendo que se cogitar, portanto, da existência de qualquer medida invasiva por parte do Supremo Tribunal Federal, maior autoridade judiciária do país”, completou.

A solicitação de Aras tinha sido feita horas antes. O procurador destacou que a atuação de órgãos de fiscalização é levada em consideração por organismos internacionais para avaliar como está sendo realizado o combate à corrupção no Brasil. No recurso enviado ao STF, Aras destaca a “recomendação do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), em que afirma que as unidades de inteligência financeira devem ser independentes e autônomas, inclusive para analisar, solicitar ou encaminhar ou disseminar informações específicas”.

Mudança de postura

A repercussão negativa do caso fez com que Aras mudasse de posicionamento. Até a noite de quinta-feira, o procurador-geral considerava não haver “risco para a integridade do sistema de inteligência financeira”. Porém, menos de 24 horas depois, após sofrer pressão de outros membros da PGR e da Receita Federal, Aras recuou. Na petição, ele defendeu a independência das unidades de inteligência financeira. “Trata-se, portanto, de medida desproporcional, que põe em risco a integridade do sistema de inteligência financeira, podendo afetar o livre exercício de direitos fundamentais”, alegou Aras sobre a decisão de Toffoli.