Correio Braziliense, n. 20714, 08/02/2020. Economia, p. 8

Inflação é a menor desde 1994

Rosana Hessel


 

A inflação oficial medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pisou no freio em janeiro na comparação com dezembro, passando de 1,15% para 0,21%, o menor patamar para o mês desde 1994, quando foi lançado o Plano Real. O resultado, divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ficou abaixo das expectativas do mercado, que esperava um avanço em torno de 0,35% no custo de vida.

Na avaliação de especialistas, a desaceleração refletiu, principalmente, o recuo nos preços da carne, que puxaram a inflação de 2019 para 4,31%, levemente acima do centro da meta, de 4,25%. Em dezembro, o custo da proteína animal disparou 18,06%, mas, em janeiro passado, houve recuo de 4,03%.

O resultado do IPCA de janeiro reforçou as apostas do mercado de manutenção da taxa básica de juros (Selic) em 4,25%, uma vez que as projeções para o IPCA variam entre 3,30% e 3,40%. Para este ano, a meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 4%. Apesar da taxa de câmbio mais valorizada, com o dólar batendo novas máximas, o choque não está sendo repassado ao consumidor, devido ao fraco desempenho da atividade econômica.

"No conjunto, os preços caíram muito acima do esperado — e de forma generalizada nos núcleos. Isso mostra que a economia continua fraca e, portanto, a demanda também", destacou o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves. "Não há espaço para o repasse da alta do dólar, porque não há demanda", ressaltou.

Juros

Na avaliação de Gonçalves, o ritmo lento da economia pode forçar o Banco Central a fazer um novo corte na Selic neste ano, apesar de ele ter sinalizado no comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom), na quarta-feira, que o ciclo de cortes dos juros foi interrompido. "Vamos ver o que o BC vai explicar na ata da semana que vem, porque eles também foram surpreendidos com a inflação mais baixa. Portanto, haverá revisão nas projeções do IPCA também para baixo diante da atividade mais fraca. Logo, não podemos descartar um novo corte na Selic neste ano", apostou.

De acordo com dados do IBGE, os grupos com as maiores altas em relação a dezembro foram: habitação, com elevação de 0,55%; alimentação e bebidas, que subiu 0,39%; e despesas pessoais, com variação positiva de 0,35%. Na contramão, os grupos de vestuário, e de saúde e cuidados pessoais tiveram recuos de 0,48% e de 0,32%, respectivamente.

As principais altas no grupo dos alimentos foram de cenoura (13,92%) e do tomate (13,72%). As maiores quedas ficaram com a cebola (de -6,06%) e a carne (de -4,03%). "Janeiro normalmente tem problemas de safra quando chove, e isso afeta preços de alimentos, mas a alta foi compensada, principalmente com a queda no preço da carne", explicou o economista do IBGE e gerente do IPCA, Pedro Kislanov.

Nova metodologia

Os dados do IPCA janeiro são os primeiros divulgados com a nova metodologia adotada pelo IBGE. Pelas contas do economista Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), a variação do IPCA pela metodologia antiga seria de 0,29%. De acordo com o economista do IBGE e gerente do IPCA, Pedro Kislanov, os itens de maior peso continuam sendo os mesmos, como aluguel, empregados domésticos, gasolina e energia elétrica. "Esses itens têm peso grande no orçamento das famílias e, portanto, o cerne do IPCA continua o mesmo", explicou.

Com a nova ponderação, a cesta de produtos do IPCA passou de 383 subitens para 377, com a inclusão de 58 novos itens e a exclusão de 64. Entre os produtos que foram incluídos na cesta estão macarrão instantâneo, com queda de 1,32%, e clínicas para tratamento e serviços de higiene para animais, com recuo de 0,19%. Os dados acumulados em 12 meses dos novos itens só deverão ser divulgados a partir de dezembro de 2020.

Na avaliação de Balassiano, apesar do repique no ano passado, os dados mostram uma inflação com perspectivas confortáveis. Conforme levantamento feito pelo economista, no triênio encerrado em 2019, a inflação ficou abaixo da meta em 3,7%, apesar do aumento dos preços da carne no fim do ano, refletindo o menor patamar desde 1998. Enquanto isso, a média móvel em três anos dos núcleos do IPCA ficou em 3% no triênio encerrado em 2019, também o menor patamar no mesmo período.

Segundo estudo feito pelo economista, os choques temporários são rapidamente revertidos sem modificar as perspectivas dos agentes, "não justificando uma resposta da política monetária". "Felizmente, a inflação não é um problema no Brasil atualmente, e 2020 poderá ser o quarto ano consecutivo de inflação abaixo ou próximo da meta", afirmou Balassiano.