Título: O Brasil e os desafios da China
Autor: Antônio Ermínio de Moraes
Fonte: Jornal do Brasil, 06/02/2005, Outras Opiniões, p. A11

A cada dia que passa, a China dá um susto ao mundo com suas taxas de crescimento. Em 2004, quando o governo decidiu desaquecer a economia, o PIB aumentou 9,5%! Ninguém consegue estancar aquela nação. Nem os próprios chineses. Mas a China tem desafios gigantescos. O país possui 1,3 bilhão de habitantes (22% da população mundial), mas possui apenas 19% de terras cultiváveis. A água disponível é menos de 7% das reservas do mundo e escasseia cada vez mais. Nos últimos 35 anos, o lençol freático do norte da China, em especial Beijing, desceu 59 metros! Nas regiões do norte e oeste, os rios e os lagos estão desaparecendo, as secas são crônicas e tudo se transforma rapidamente em um grande deserto.

Para complicar, o excesso de aração, combinado com ventos fortíssimos, tem provocado uma verdadeira debandada dos poucos solos produtivos. Terríveis ventanias levam para longe _na forma de poeira_ os poucos nutrientes que ainda restam no solo chinês (Lester Brown, 'Outgrowing the Earth, W.W.Norton & Company, 2004).

Tais restrições comprometem seriamente a segurança alimentar do país, o que constitui um problema grave quando se leva em conta o tamanho da população e a amarga experiência de fome que, em 1959-61, dizimou 30 milhões de pessoas.

E não é só isso. A China é pobre em energia. Mais de 70% da energia consumida vem de um carvão de má qualidade e altamente poluidor _outro desafio a ser enfrentado no futuro próximo.

Será que a China pode ser auto-suficiente em alimentos e energia? Tudo indica que não. Para se manterem vivos e saudáveis, cada ser humano precisa de quase 200 litros de água por dia _72 metros cúbicos anuais. Além disso, eles dependem da agricultura e da indústria, por sua vez, sustentadas pela energia. Se esta for hídrica, a necessidade humana se eleva para mil metros cúbicos por ano! São cifras impensáveis para a China. Para produzir uma tonelada de alimentos são necessárias 1.000 toneladas de água.

O Brasil é mesmo um país privilegiado. Só a Bacia Amazônica tem 16% da água do mundo. Nossas chuvas são generosas. Além disso, temos vários aqüíferos (água subterrânea) ainda intocáveis. As terras continuam abundantes.

Por isso, o Brasil é o candidato natural para complementar as necessidades chinesas. Mas, é claro, precisamos fazer boas trocas. Os chineses são bons negociantes. Temos de nivelá-los, pelo menos. Quando isso ocorrer, aumentarão muito as oportunidades para se alavancar de modo substancial o nosso crescimento econômico e promover o progresso social.

Tudo isso se não sair uma guerra no seio da Ásia por causa de água e energia...