Título: Água, o grande problema da China
Autor: ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
Fonte: Jornal do Brasil, 06/03/2005, Outras Opiniões, p. A11

De repente, o encantamento que os países avançados tinham pela China transformou-se em desencanto e apreensão. O mundo começa a ficar com medo da China. As reações são as mais variadas. Algumas veladas, outras abertas. A União Européia abriu o verbo ao negar, na semana passada, o reconhecimento da China como economia de mercado.

O Ministério Europeu considera que a China está longe de praticar um comércio baseado na parceria leal. Como argumentos, foram usados o desrespeito aos direitos de propriedade intelectual, a falta de transparência das regras comerciais e a intervenção direta do Estado no comércio internacional.

Por trás de tudo isso, sejamos claros, está o pesadelo da invasão de produtos chineses no mercado europeu e norte-americano. Aliás, os Estados Unidos também não escondem seu desconforto com a China, enfatizando o irrealismo da cotação do yuan e o desrespeito aos direitos humanos.

A verdade é que o mundo não está conseguindo competir com a China. O gigante asiático tem condições imbatíveis. Dispondo de uma imensidão de trabalhadores e usando e abusando dos subsídios garantidos pelo Estado Comunista, as empresas chinesas contam com exércitos de empregados que trabalham pelo equivalente a US$ 0,64 por hora enquanto que nos Estados Unidos o salário horário está em US$ 20,00 e na Alemanha US$ 30,00.

Com um peso tão pequeno do fator trabalho no custo de produção, a China consegue produzir muito mais barato do que o resto do mundo. A Europa e os Estados Unidos podem tentar todo e qualquer tipo de estratégia produtiva existente e, ainda assim, não conseguirão superar as vantagens chinesas. Por isso, partem para o protecionismo.

E o Brasil, como fica nisso tudo? O embaixador Rubens Barbosa usa uma expressão muito adequada: ''O Brasil não vende para a China. É a China que compra do Brasil''. Sim porque, tendo de alimentar 1,3 bilhão de pessoas, a China depende desesperadamente dos nossos produtos agrícolas.

Estaria aí a nossa tábua de salvação se o comércio pudesse se equilibrar trocando produtos primários por bens sofisticados. Em 2004, a entrada de eletrodomésticos chineses no Brasil aumentou 514% em relação a 2003 e a de materiais de transportes cresceu 265%.

Apesar de nossas vantagens comparativas no campo dos recursos naturais, o Brasil não pode correr o risco de gestar um desequilíbrio de grande escala no comércio com a China. Talvez seja o caso de assegurar que o governo chinês cumpra com todas as promessas apresentadas antes de materializarmos o compromisso de reconhecimento da economia de mercado. Não se trata de fechamento e nem de protecionismo gratuito, mas apenas de uma medida para garantir, sobretudo, o futuro dos nossos empregos.

O grande perigo da produção chinesa é a falta de água que já se faz sentir na nação, mais enfaticamente na região Noroeste daquele país.