Título: ''Brasília deve ser rota obrigatória''
Autor: Danyella Proença
Fonte: Jornal do Brasil, 06/03/2005, Brasília, p. D3

Para a secretária de Turismo, Lúcia Flecha de Lima, Brasília está na moda. Apostando na quebra do estereótipo de que a cidade é fria e impessoal, a secretária falou ao Jornal do Brasil sobre como pretende fazer de Brasília rota obrigatória no turismo nacional. Para isso, afirma investir em parcerias com as Secretarias de Cultura e de Esporte, partindo da idéia de que somente com o casamento entre esses três setores o turismo pode ser impulsionado. Em seu segundo ano de cargo, Lúcia Flecha de Lima tem como grande trunfo a reforma do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, cuja inauguração está prevista para o aniversário de Brasília. A secretária acredita que a obra deva impulsionar o turismo de negócios, congressos e eventos na cidade. Como contou ao Jornal do Brasil, esses serão, ao lado do turismo cívico, os principais focos da Secretaria de Turismo para 2005.

- Uma pesquisa recente da Embratur constatou que os desembarques internacionais no Aeroporto Juscelino Kubitschek teriam aumentado 961% no ano passado e os nacionais, 58%. A que a senhora atribui esse resultado?

- Esses números foram tão impressionantes, que o ministro Mares Guia [do Turismo]pediu à Embratur para revisar. De cerca de 1.500 desembarques internacionais, passou para mais de 15 mil em 2004. Isso porque a gente ainda não têm vôos que venham diretamente de fora..

- Em 2004, a Secreta ria declarou a intenção de ampliar os vôos. O que está sendo feito nesse sentido?

- Estamos lutando para que a TAP, uma companhia aérea de Portugal, tenha pouso direto em Brasília. Mas aí a gente precisa da vontade política. A TAP já tem 38 vôos para o Brasil, mas todos para o Nordeste. A gente quer esse vôo para Brasília porque eles pegam na Europa passageiros de outros países, todos com muito interesse em Brasilia. Eles desembarcam aqui e podem fazer o programa Brasil Central, visitando as regiões próximas. O Pantanal, por exemplo, é muito pouco conhecido. E Brasília é a porta de entrada de todos esses lugares.

- Para este ano, a Secretaria já deve ter algo concreto em relação aos vôos internacionais?

- Nós temos um aeroporto absolutamente preparado para receber os vôos internacionais. Só estão faltando os vôos. Se a TAP comprar a nossa idéia, começa logo. Se não, nós já estamos em conversação, inclusive através de pessoas do Itamarati, para vôos de países sul-americanos que têm companhias poderosas. Queremos começar logo.

- Está havendo uma mudança de olhar sobre Brasília?

- Acho que sim. Brasília está na rota e é mais do que justo, porque é uma cidade maravilhosa, é a capital do País. Hoje oferecemos uma opção muito grande de roteiros. Afinal, o que é turismo? É promoção. Para divulgar um lugar turístico, temos que promovê-lo. Se você nunca ouviu falar, como é que você vai ter vontade de ir? A chave está em promover e divulgar. É o que temos feito.

- Que países estão sendo focos principais dessa campanha?

- Seguimos o calendário de feiras da Embratur. E, por lá, a gente escolhe quais são as mais interessantes para Brasília. Já participamos de três feiras internacionais este ano, em Lisboa, Madri e Milão.

- Em que aspectos se está investindo mais?

- Não só os monumentos de Brasília maravilhosos. A gente está trabalhando os esportes aquáticos no Lago Paranoá - hoje, Brasília já é a segunda marina do Brasil em número de barcos -, as trilhas em volta de Brasília, as cachoeiras. O turismo místico também é muito forte nessa faixa em que estamos, que é o paralelo 45. Brasília tem templo de tudo - católico, budista, Legião da Boa Vontade, mesquitas. Todas as religiões estão representadas aqui. Dizem que Brasília tem uma força mística muito grande.

- Podemos dizer que a idéia da Secretaria é romper com a imagem de uma Brasília fria e desumana?

- É romper com essa idéia de uma Brasília só burocrática. É muito importante que Brasília seja a capital, que todos os poderes estejam aqui, que seja o centro de todas as decisões nacionais. Tudo isso é muito importante, mas os aspectos humanos da cidade são essenciais.

- Como a Secretaria está trabalhando para que a própria população de Brasília perceba esses aspectos humanos?

- A gente precisa, antes de tudo, levantar a auto-estima do brasiliense, para que ele tenha realmente amor e respeito pela sua cidade.

- Para que o turismo seja realmente impulsionado, é preciso também trabalhar os setores de serviços complementares. O que a Secretaria está fazendo nesse sentido?

- É preciso convencer todo o trade turístico de que não se deve explorar o turista. O turista está aqui para trazer dinheiro para a capital e é uma boa fonte de renda. Ninguém pode matar a galinha dos ovos de ouro, porque o turista não é bobo. Se a gente cobrar preços absurdos de uma vez, o turista vai embora.

- Mas já há algo de concreto sendo feito para conscientizar esses prestadores de serviços?

- Temos projetos excelentes envolvendo a qualificação de taxistas, que só não foram implantados ainda por motivos políticos. O projeto envolve um sistema de estrelas, de ouro, prata ou bronze. Quem tiver a de ouro, por exemplo, poderá fazer determinados roteiros. Também trabalhamos para conscientizar os taxistas a investirem nos carros. A gente tem que dar um jeito de os táxis e os taxistas terem uma aparência melhor.

- Quando será implantado o sistema de sinalização para turistas?

- Em duas ou três semanas. A Secretaria de Turismo conseguiu os recursos e a Secretaria de Transportes está fabricando as placas, que vão começar a ser implantadas primeiro no Eixo Monumental.

- A senhora declarou que o turismo de negócios deve ser o foco da Secretaria de Turismo. A inauguração da primeira etapa do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, no dia 21 de abril, deve impulsionar esse setor?

- Sem dúvidas. O Centro de Convenções está lindo, muito bem feito e com uma tecnologia de ponta. Com ele, queremos impulsionar o turismo de congressos, eventos e negócios. São três tipos. Nos eventos, em geral, a parte institucional é muito importante. São acontecimentos em que se quer ver o presidente da República, senadores, ministros. E aqui é só atravessar a rua. Essa é nossa grande vantagem sobre os outros centros de convenções do Brasil.

- Em quanto ficou a obra do Centro de Convenções?

- Num total de R$ 100 milhões.

- A Secretaria de Turismo já tem algum evento agendado para o Centro de Convenções?

- De 8 a 12 de maio, vamos ter a 1ª Reunião de Cúpula dos Países Árabes e Sul-Americanos, para a qual são esperados 33 chefes de Estado. A conferência vai inaugurar o Centro de Convenções. Ontem estive com o presidente do Conselho Federal de Odontologia e ele pretende realizar um congresso aqui em outubro, o que deve trazer à cidade cerca de 7 mil pessoas. Temos eventos agendados até 2009.

- Que estrutura será oferecida para esses eventos?

- As pessoas não têm dimensão do esforço conjunto para que o Centro de Convenções saísse. O equipamento é muito caro. É tudo muito caprichado. O auditório seria para 4.200 pessoas, mas acabou passando pra 3.600 por causa da acessibilidade. Vai ter poltronas especiais pra pessoas mais gordas, mais altas, pra portadores de necessidades especiais. Além do auditório, teremos 14 salas de apoio.

- Além do turismo de negócios, qual seria outro principal foco da Secretaria?

- O turismo cívico. Será realmente um filão pra Brasília. Não é possível que uma criança brasileira de classe média visite três ou quatro vezes a Disney e nunca tenha vindo a Brasília. Os pais não têm a preocupação de mostrar a capital do Brasil, de mostrar como funciona o Congresso, o Palácio do Planalto, o Itamaraty. O turismo cívico é essencial, porque assim as crianças vão crescer com respeito pelas instituições do País e sabendo como elas funcionam.

- O que a Secretaria está fazendo para estimular o interesse pelo turismo cívico?

- Nós já temos um projeto para isso. Já tivemos colégios aqui no ano passado e o maior colégio de São Paulo vai mandar alunos no final desse mês. Na parte mais avançada desse projeto, temos a idéia de que uma escola particular financie a vinda de uma escola pública. Também quero conseguir do Ministério da Educação, mas ainda não tentei isso, que o turismo cívico entre no currículo escolar. Seria o equivalente a uma prova de História.

- E o projeto Brasília em Alta? Como estão os preparativos para a edição 2005?

- Demos uma parada porque mudou a chefia do Gabinete de Articulação Institucional. Agora é que o projeto está sendo reorganizado. Mas foi uma coisa que deu muito certo e neste ano tem chances de dar muito mais, principalmente se conseguirmos casar o dinheiro público com o privado. A idéia de atrair pessoas de cidades próximas, em um raio até 700 km, teve muito sucesso.

- Qual será a contribuição da Secretaria nessa edição?

- A Secretaria de Turismo incentiva e organiza, mas os eventos são feitos pelas Secretarias de Cultura e Esporte. O Turismo apóia e faz feiras . Esse ano, nossa contribuição vai ser um Festival Gastronômico, que vai pegar uma parte do Brasília em Alta. Na verdade, vamos divulgar o Festival Internacional de Gastronomia durante o Brasília em Alta, que acontece em julho e agosto.

- Secretária, fazendo um balanço de sua gestão, quais foram as principais realizações e o que ainda falta ser feito?

- A maior realização, sem dúvidas, é o Centro de Convenções. O projeto estava emperrado há algum tempo e nós conseguimos interessar o governo. Isso bate qualquer coisa. Depois, fizemos convênios com duas grandes operadoras de turismo, a CVC e a Bancorbrás, que agora já têm pacotes para Brasília na prateleira. Vamos lançar agora o Programa de Sinalização Turística. Também já começamos a trabalhar no plano diretor de turismo, que vai identificar os assuntos mais relevantes pra cidade e vai nos mostrar onde precisamos atuar mais. Não adianta atirar no escuro.

- E o que a Secretaria ainda não conseguiu fazer?

- Falta, por exemplo, a melhor conservação dos monumentos e a capacitação dos servidores de turismo. Não há como capacitar um dono de hotel. O que podemos fazer é dar a ele a oportunidade de capacitar seus funcionários. Outro ponto é o Projeto Orla, que já está sendo tocado. E também a revitalização da Torre de TV, para deixar a feira com um aspecto melhor. O projeto deve ser executado ainda esse ano. Já temos o projeto pronto e fizemos a triagem dos artesãos, mas as negociações com eles foi delicada. Há muita resistência dos que não estão regularizados. Estamos fazendo tudo com muito cuidado, para não parecer que queremos tirar o emprego deles. Nossa intenção é dar a eles melhores condições de trabalho, porque precisamos deles para o turismo e para a cultura.