O Estado de S. Paulo, n. 46167, 12/03/2020. Economia, p. B1

Congresso derruba veto de Bolsonaro, amplia BPC e governo vê teto em risco
Idiana Tomazelli
Camila Turtelli
Adriana Fernandes 


 

Em um momento de desaceleração da economia e incertezas por conta do avanço do novo coronavírus, o Congresso Nacional impôs ontem uma derrota ao governo ao criar fatura adicional de R$ 20 bilhões anuais por meio da ampliação do alcance do chamado Benefício de Prestação Continuada (BPC) voltado para a baixa renda. O resultado da votação ganhou contornos de crise na equipe econômica, que prevê maior dificuldade para fechar as contas diante do cenário de queda na arrecadação e necessidade de frear gastos com custeio e investimento.

A decisão do Legislativo permite a concessão do BPC (um salário mínimo, hoje em R$ 1.045,00) a idosos com mais de 65 anos e pessoas com deficiência com renda familiar de até R$ 522,50 por pessoa. Antes, eram elegíveis as famílias com renda de até R$ 261,25 por pessoa. Com a ampliação, o governo estima um custo adicional de R$ 217 bilhões em uma década – o equivalente a 27% da economia obtida com a reforma da Previdência. Vai aumentar também a fila de espera por benefícios do INSS, que já acumula 1,9 milhão de pessoas.

O secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, afirmou ao Estadão/Broadcast que a medida “pode significar o fim do teto de gastos”. O mecanismo, que limita o avanço das despesas à inflação, é considerado a grande “âncora” para a confiança dos investidores no ajuste fiscal em curso no País. A ele são atribuídos os resultados mais favoráveis na dívida pública brasileira e as taxas de juros básicos da economia em mínimas históricas.

Para o secretário, é “improvável” que o Congresso faça a compensação com o corte de outra despesa obrigatória: “Isso pode significar o fim do teto dos gastos e, assim, um ajuste fiscal só poderá ser feito com aumento de carga tributária em um País que já tem a carga tributária de país rico, perto de 34% do PIB”.

Saída jurídica. Segundo apurou a reportagem, a equipe econômica deve buscar uma saída jurídica para barrar a decisão do Congresso neste ano, solução que já está sendo analisada pelos técnicos. Acionar o Tribunal de Contas da União (TCU) também não está descartado. A Corte de contas já decidiu, em outras ocasiões, pela suspensão da aplicação de medidas com custo fiscal até que houvesse compensação no Orçamento.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tido como aliado da equipe econômica na pauta de ajuste, discordou do diagnóstico de Mansueto sobre o fim do teto de gastos, mas reconheceu a necessidade de encontrar uma saída: “Nada é o fim do mundo, mas não é uma decisão boa (do Congresso). Mas acho que a gente ainda tem um prazo.”