Título: Coisas do Brasil: O sucesso em tempos de miséria
Autor: Israel Tabak
Fonte: Jornal do Brasil, 08/03/2005, País, p. A6

As pesquisas de opinião indicam que a popularidade de Lula se mantém intacta, apesar das trapalhadas e destemperos verbais. A população mais carente - beneficiada com os programas sociais e identificada com o jeito espontâneo do presidente - e amplos setores da classe média - que vêem com bons olhos a estabilidade econômica - seriam as origens destes bons índices, segundo os especialistas. O marketing político do Planalto vai bem. Isso é inegável. Só que altos percentuais de aprovação, num país em que as cidades se favelizam e os grotões ainda vivem sob o tacão de coronéis, não significam que o governo esteja pondo o dedo na ferida. A explicação oficial é conhecida: os males são tão antigos que é impossível resolver tudo em dois anos de mandato. Algo que lembra o crescer para depois dividir o bolo.

Crescer, aumentar o número de empregos, que é uma promessa para a segunda metade do mandato, historicamente nunca foram uma palavra de ordem do PT. Essa agenda se identifica muito mais com os tempos desenvolvimentistas de JK.

A proposta original do PT é mais ambiciosa, ancorada na inclusão social, que pressupõe um combate sem trégua às tremendas disparidades que não serão resolvidas com programas assistenciais. Há fartos exemplos de administrações patriarcais, com práticas antiquadas, que rendem altos dividendos eleitorais em tempos de pauperização crescente.

A questão não é de tempo, é de disposição. Não há indicação de que o governo, em todos os setores, tenha optado por posições mais coerentes com o ideário que levou Lula à Presidência. A simples ameaça à ''governabilidade'', representada por um pacto político cada vez mais roto, é suficiente para que os articuladores do Planalto tirem o pé do acelerador.

O setor ambiental é bom exemplo. Até o assassinato de Dorothy Stang, os ambientalistas estavam perdendo de goleada do lobby que, no Executivo e no Legislativo, não se constrange em admitir a devastação ambiental, desde que isso assegure bons negócios. Após o crime, o governo se mexeu. Resta saber se foi uma guinada ou apenas um solavanco.