Título: Elas têm a força
Autor: Mariana Filgueiras
Fonte: Jornal do Brasil, 08/03/2005, Rio, p. A13

Mulheres que atuam na defesa da cidadania e dos direitos humanos já fazem parte da história e do cotidiano cariocas

Elas estão à frente das questões que mobilizam a cidade, concentram atenção da mídia, dividem a opinião pública e nem assim perdem a ternura. No Dia Internacional da Mulher, o Rio de Janeiro tem motivos de sobra para se orgulhar de cariocas que marcam posição e atuam de forma decisiva em áreas como segurança pública, saúde, meio ambiente e direitos humanos. Muitas vezes acumulando funções de mãe e dona-de-casa, fazem valer cada milímetro do avanço das conquistas da mulher. Depois de deixar as filhas na escola todas as manhãs, a promotora Mônica Costa di Piero, 42 anos, vai para seu gabinete, no Ministério Público estadual, onde se dedica a temas bem conhecidos por todos os cariocas. Foi a responsável pelas denúncias do desabamento do Palace II, do caso Staheli, das brigas de pitboys da Zona Sul, denunciou o sumiço da fita com imagens do momento em que a estudante Luciana Gonçalves Novaes foi baleada na Universidade Estácio de Sá, há dois anos. Mônica garante que nunca foi discriminada por ser mulher, e destaca que algumas características femininas são fundamentais nas horas mais difíceis da profissão.

- A intuição e a sensibilidade fazem diferença. Apesar de ter trabalhado em casos de repercussão nacional, é nos anônimos que me sinto mais produtiva. Eu gosto quando posso sair da capa de promotora e me aproximar pessoalmente. Há quatro anos, por exemplo, consegui provar que crianças de um condomínio de classe média alta da Barra da Tijuca sofriam abusos sexuais. O agressor está preso. O fato de ser mãe contribui para a minha sensibilidade em relação às crianças, com certeza - orgulha-se.

Quando o assunto é Justiça, o Rio faz história e ostenta um feito de repercussão nacional. Hoje deputada federal pelo PPS, a juíza Denise Frossard ficou conhecida em todo o país ao colocar na prisão 14 acusados de ligações com o jogo do bicho, em 1993. Apesar das conquistas, Denise não vê motivos para comemorar o Dia Internacional da Mulher no parlamento. E uma de suas insatisfações é com o baixo número de cadeiras ocupadas por mulheres na Câmara.

- Eu me sinto envergonhada. Não somos nem 10% no parlamento. Nenhum líder de partido é mulher. Em termos de gênero, o Brasil é um fracasso - indigna-se.

A deputada aponta o equilíbrio de homens e mulheres na Câmara como instrumento vital para diminuir a corrupção. De acordo com ela, um relatório de 2001 feito pelo Banco Mundial divulga essa relação. Mais de cem países foram consultados. Em Bangladesh, considerado o país mais corrupto, a participação feminina no parlamento é de apenas 9,1%. Na Finlândia, o menos corrupto, as mulheres ocupam 36,5% das cadeiras. O Brasil, que ficou em 54º lugar nos índices de corrupção, tem menos de 10% de mulheres no parlamento.

- A sociedade não pode ser representada só por homens. É preciso investir em educação, pois não acredito nas cotas ou ações afirmativas para atingir este equilíbrio - conclui a deputada.

Apesar da baixa representatividade na Câmara, as mulheres, no Rio, dão exemplo de coragem. A inspetora Marina Maggessi, 44 anos, já esteve à frente da Delegacia de Repressão a Entorpecentes, foi coordenadora de inteligência da Polícia Civil no Rio de Janeiro e hoje trabalha com uma equipe de 15 homens. No seu escritório, flores do campo e imagens de São Francisco de Assis e Santa Rita de Cássia ficam sobre a mesa para protegê-la e para conservar a feminilidade.

- A mulher tem a capacidade de segurar os ânimos, de desatar nós, de levantar a auto-estima. O bandido, quando olha uma policial no olho, não reage da mesma forma. Ele fica mais nervoso. A presença da mulher intimida - explica Marina.

Presidente do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro desde 2003, a doutora em sociologia Ana Paula Miranda, 35 anos, ainda encontra tempo para dar aulas na Faculdade Candido Mendes e para cuidar da família. Ana Paula diz que a ajuda de outras mulheres é fundamental para o cumprimento de tantas tarefas. E que não deixa sua feminilidade de lado.

- Não abro mão do exercício e da manicure. E ainda quero voltar a estudar francês. Temos que ter tempo para nós mesmas. Não quero, no futuro, cobrar de alguém que me sacrifiquei - afirma.

Para cuidar da casa, Ana Paula adotou com o marido o que chama de ''gestão compartilhada''.

- A cada 15 dias, um de nós fica responsável pelas compras - conta.

Sobre a possibilidade das múltiplas tarefas serem desempenhadas pelo sexo oposto, ela é enfática.

- Homens não são geneticamente aptos a darem conta de fazer mais de uma coisa de cada vez - diverte-se.