Correio Braziliense, n. 20692, 17/01/2020. Negócios, p. 9

Etanol sem intermediários

Ingrid Soares 
Simone Kafruni



O governo está determinado a liberar a venda de etanol das usinas aos postos, sem passar pelas distribuidoras, para baratear o custo do combustível em R$ 0,20. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pedirá ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para acelerar a votação de um dos projetos que tramitam na Casa para liberação da venda direta. O governo ainda estuda qual a “via mais rápida” para a aprovação. Representantes do setor sucroalcooleiro se reuniram ontem com o presidente Bolsonaro e o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.

A mobilização do governo seria para o parlamento votar o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 978/18, de autoria do senador Otto Alencar (PSD-BA). O texto anula um artigo da Resolução 43/09 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que veda a comercialização de etanol diretamente entre os postos e as usinas. Bolsonaro defende que a exclusão de intermediários pode reduzir o custo do álcool nas bombas e baratear a gasolina, que tem entre 18% e 27% de etanol anidro. Mas a venda direta não agrada todo o setor.

O chefe do Executivo se reuniu ontem com o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, o presidente do Sindaçúcar de Alagoas, Pedro Robério de Melo Nogueira, e Renato Augusto Pontes Cunha, presidente do Sindaçúcar de Pernambuco. Albuquerque também recebeu o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar, Evandro Gussi.

“O presidente disse que é um projeto dele simplificar a comercialização de combustíveis em defesa do consumidor. Mas é um assunto complexo, que envolve agência reguladora e, eventualmente, o parlamento”, disse Nogueira. “O presidente quer a via mais rápida, se é pelo Executivo, passando pelas agências, ou se se pega uma carona no processo legislativo. Para nós, pelo Congresso, a votação poderia ser concluída até março”, estimou.

Nogueira afirmou que a liberação da venda direta impactará no preço final do combustível. “Imagina a quantidade de postos que existem perto de usinas no Brasil inteiro e não podem vender diretamente? Há situações em que a distância entre o posto e a usina é de 5 km, enquanto a base de distribuição fica a 200 km”, apontou.

Liberdade de mercado

Cunha, do Sindaçúcar de Pernambuco, disse que os sindicatos e os produtores do Nordeste defendem a tese da venda direta, sem atrapalhar o processo via distribuidoras. “Pode ser das duas formas, porque os impostos são assegurados no âmbito da Receita Federal. Mas existe um obstáculo na ANP, que, ao ser revogado, vai liberar os dois caminhos”, ressaltou. Segundo ele, em fevereiro, haverá uma reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) para dar sequência ao assunto.

O presidente da União da Indústria da Cana-de-Açúcar, Evandro Gussi, destacou que a postura da entidade é em defesa da liberdade. “Temos contribuído para que a decisão do presidente seja a melhor possível, de forma que o sistema mais viável para o Nordeste possa conviver com outro, mais racional para o Centro-Sul, onde está 93% da produção”, explicou.

Segundo ele, alguns produtores podem optar por empresas de distribuição dada a distância dos centros consumidores. “Os players vão entender qual operação faz mais sentido. A Unica está contribuindo com dados técnicos, para mostrar os efeitos colaterais de uma medida como essa, para que a decisão seja coordenada com instrumentos de mercado”, ressaltou.