O Estado de S. Paulo, n. 46891, 06/03/2020. Economia & Negócios, p. B2

Brasil pode diminuir dependência externa ao produzir adubo orgânico

José Maria Tomazela


 

O produtor Paulo Montenegro Fachinni está substituindo o adubo químico pelo fertilizante orgânico composto em sua plantação de cana-deaçúcar, em Bocaina, no interior de São Paulo. Ele é de uma família que há mais de 120 anos cultiva cana e em 2016 aderiu ao uso do insumo, fabricado a partir da compostagem de lodos do tratamento biológico de esgotos e resíduos orgânicos agroindustriais. “Comecei aplicando de 7,5 a 10 toneladas por hectare diretamente no sulco de plantio. Nessas operações, raramente faço complementação com fertilizantes minerais, mas, quando acho necessário, reduzo a aplicação do adubo mineral a 50% do recomendado”, disse.

O Brasil pode reduzir a dependência de adubos importados de países como a Rússia investindo mais na produção de fertilizantes orgânicos, produzidos a partir de subprodutos das atividades agrícolas, pecuária, agroindustrial e de saneamento urbano, ou seja, resíduos que normalmente são descartados. O adubo orgânico não substitui o uso do fertilizante químico, mas pode reduzir em até 50% sua aplicação e ainda melhora a produtividade da lavoura.

O insumo natural facilita a absorção do fósforo pela planta, evitando que esse mineral se perca no solo e acabe contaminando os mananciais. De acordo com o engenheiro agrônomo Fernando Carvalho Oliveira, da Tera Ambiental, especializada em reciclagem de efluentes e resíduos orgânicos, a produção de fertilizantes orgânicos no Brasil ainda está se organizando, mas tem grande potencial para crescer. Em 2020, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal (Abisolo), o setor faturou R$ 334 milhões, 44,5% de crescimento em relação a 2019.

“Com base nesse faturamento, é possível estimar que a produção seja de 1,5 milhão de toneladas ao ano”, disse. A tecnologia mais usada pelo setor é a compostagem termofílica (micro-organismos que gostam do calor). “A produção vem numa crescente no Brasil nos últimos cinco anos, devido à satisfatória evolução do marco regulatório que orienta o segmento. As unidades fabris atualmente instaladas estão buscando aumentar sua produção ao nível máximo e ainda deve ficar aquém da demanda”, disse. Segundo o especialista, os fertilizantes orgânicos não substituem os minerais, mas contribuem para seu aproveitamento no solo, reduzindo as taxas de aplicação com ganhos de produtividade.

Produção. É o que o agricultor Fachinni já verificou na prática. A partir do primeiro corte da cana, ele reduziu a adubação orgânica para 5 toneladas por hectare e a adubação mineral em 40% do recomendado. Em algumas áreas que já tiveram cinco anos de aplicações sucessivas do orgânico, a redução é ainda maior.

“Com essa estratégia, aliada aos demais tratos culturais, tenho alcançado produtividade acima da média regional e entendo que, com a adubação orgânica, estou investindo na qualidade do solo de minha fazenda.” Atualmente, o preço dos fertilizantes orgânicos varia entre R$ 200 a R$ 450 a tonelada, dependendo da distância da área agrícola. A tonelada de adubo químico já custa mais de R$ 2 mil, embora a quantidade aplicada por hectare seja menor.

Em alta

R$ 334 mi

foi o faturamento do setor de fertilizantes orgânicos em 2020, segundo a Abisol

44,5%

foi o crescimento das vendas do produto em 2020 se comparadas com 2019

1,5 milhão

de toneladas de fertilizantes orgânicos foram produzidas em 2020 no País