Correio Braziliense, n. 21363, 11/09/2021. Política, p. 4

Ato mobiliza mulheres indígenas



Cerca de cinco mil mulheres, de 172 etnias indígenas, marcharam, ontem, na região central de Brasília, para garantir o direito ancestral pela terra e pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a votar contra o marco temporal, que define a demarcação das terras e restringe o direito à propriedade somente às áreas já ocupadas na data da promulgação da Constituição de 1988. De cocares na cabeça, pinturas de guerra pelo corpo e maracas nas mãos, elas saíram do acampamento Luta pela Vida, na Funarte, no centro da capital, até a Praça do Compromisso, na Asa Sul, onde foi erguida uma estátua em homenagem a Galdino Pataxó, índio queimado vivo por jovens brasilienses, em 1997.

Esta segunda edição da marcha estava agendada para o 7 de Setembro e seguiria da Catedral ao STF, pela Esplanada dos Ministérios. Foi adiada e teve o roteiro alterado para evitar possíveis conflitos com bolsonaristas, que continuavam acampados na Esplanada dos Ministérios, mesmo após os atos antidemocráticos do feriado. Entre rezas, discursos e danças, as indígenas, em frente à estátua, e em um ato simbólico com grito de "fora Bolsonaro", queimaram um boneco do presidente da República. Em seguida, voltaram para o acampamento indígena.

Braulina Baniwa, de São Gabriel da Cachoeira (AM), coordenadora da Associação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), explicou que todos se se organizam de uma forma bem coletiva. "Não tem hierarquia", disse.

Sônia Guajajara, do Maranhão, que foi candidata à Vice-Presidência da República em 2018 pelo PSol, destacou que o momento simbólico "ali na praça foi para dizer basta de violência, basta desse processo de retrocesso dos direitos indígenas".

"O corpo indígena continua sendo silenciado, continua sendo violentado e quando o mesmo cara que matou um de nós assume uma posição no lugar que assumiu, isso mexe um pouco com a memória triste de perdermos um parente", disse Sônia, referindo-se a Gutemberg Nader de Almeida Júnior, um dos cinco jovens que queimaram Galdino, assumiu, em 3 de janeiro de 2020, a chefia da Divisão de Testes, Qualidade e Implantação da Polícia Rodoviária Federal.

"Nosso país às portas de uma ditadura. Nós vamos aceitar isso? Não. As mulheres indígenas também vieram para dizer que não estão de acordo com isso. A gente busca nesse espaço, nessa articulação no Brasil inteiro, também opinar", complementou Puyr Tembé, do Pará, da coordenação da Anmiga e uma das organizadoras da marcha.

A deputada federal indígena Joênia Wapixana (Rede-RR), destacou outro motivo da manifestação das mulheres. "Vieram discutir alguns assuntos relacionados à violência e também à abordagem específica de mulheres que vivem em diferentes biomas, justamente para mostrar a diversidade dos povos indígenas no país", explicou.