Correio Braziliense, n. 20622, 08/11/2019. Política, p. 3

Especialistas divergem



Especialistas ouvidos pelo Correio expressaram opiniões diferentes a respeito da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu prisão após condenação em segunda instância. Para a advogada Vera Chemin, mestre em administração pública e pesquisadora do direito constitucional, o resultado do julgamento representa um retrocesso que pode trazer prejuízos até mesmo econômicos ao país.

“Eu considero que essa decisão, infelizmente, equivale a um retrocesso do ponto de vista jurídico, do ponto de vista político e também do ponto de vista da imagem do Brasil diante dos demais países que, há muito tempo, adotam o costume de prender o réu inclusive depois da primeira instância”, destacou. “Essa decisão, além de tudo, provoca insegurança jurídica, a partir do momento que o Supremo mudou sua jurisprudência muito rapidamente, ou seja, em um espaço de apenas três anos, de 2016 até 2019. Essa incerteza não é boa, inclusive, para a entrada de investimentos estrangeiros no país. Então, além de tudo, ela deve prejudicar o Brasil do ponto de vista macroeconômico.”

De acordo com ela, “a evolução do direito precisa acompanhar, necessariamente, as mudanças de valores e princípios da sociedade”. “Não se trata de ouvir a opinião pública, de agradar a opinião pública, mas sim de a Constituição se atualizar para manter a sua força normativa e não ficar superada”, frisou Chemin.

Ela acrescentou que a decisão da Suprema Corte só vai valer depois de o acórdão do julgamento ser publicado no site do tribunal. “A partir daí, é lógico que cada juízo competente terá a responsabilidade de analisar cada caso e determinar a soltura de cada réu, com algumas exceções, por exemplo, para o réu extremamente perigoso, ou um traficante de drogas, ou algo parecido”, explicou. “Com relação aos crimes do colarinho-branco, é uma questão apenas de a defesa do réu pedir a soltura. No âmbito dos processos da Lava-Jato, depois de publicado o acórdão, é possível que o ministro Edson Fachin, relator da força-tarefa no Supremo, determine já para cada juízo competente a soltura dos réus.”

Já o advogado criminalista João Paulo Martinelli, professor de direito penal e econômico da Escola de Direito do Brasil (EDB), considerou positiva a decisão do STF. “Eu concordo em quase tudo, pois entendo que a Constituição é muito clara sobre o trânsito em julgado, já que ninguém pode cumprir pena enquanto ainda é considerado inocente, e essa presunção de inocência só desaparece quando a condenação transitar em julgado”, argumentou. (JV e RS)

OAB comemora

Em nota, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, comemorou o resultado no STF. “Ao propor a Ação Declaratória de Constitucionalidade, hoje (ontem) acolhida pelo Supremo Tribunal Federal, a OAB cumpriu seu papel legal, de defender a Constituição, a ordem jurídica e o Estado democrático de direito. E a decisão do STF reafirma que não pode haver justiça, não pode haver democracia, se forem relativizados ou desrespeitados os direitos fundamentais estabelecidos na Constituição”, afirmou. “O direito de defesa e a presunção de inocência de cada cidadã e cidadão saem fortalecidos desse julgamento.”