Título: Governo prevê mais tensão no campo
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Fonte: Jornal do Brasil, 18/03/2005, País, p. A6

A expectativa no governo federal é de que aumente a tensão na zona rural este ano. Ao prestar depoimento sobre invasões de terra e mortes no campo, junto ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, a superintendente do Incra em Pernambuco, Maria Oliveira - ex-ouvidora agrária nacional substituta - previu nova crise. Segundo ela, o estado e as polícias estão despreparados para lidar com o aumento dos conflitos agrários:

- Temos muita preocupação com 2005. Acho que virão algumas mobilizações mais fortes.

Ano passado, o Incra contabilizou 327 invasões de fazendas no país, número três vezes maior que o de 2002, último período da gestão de Fernando Henrique Cardoso, que fechou com 103 invasões. A superintendente do Incra alerta para o fato de que estados que tinham zerado as ocupações voltaram a registrar conflitos no governo Lula, a exemplo do Paraná e Mato Grosso do Sul. No Distrito Federal e entorno, foram 13 ocupações no ano passado, quantidade que ela considera ''altíssima''.

- Essas áreas ocupadas em 2004 têm forte desmembramento de crise no campo em 2005 - prevê.

Durante a palestra, Maria estava acompanhada do ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva. Os dois são os maiores especialistas em conflitos agrários no país. Maria e Gercino intermediaram a negociação entre polícia e sem-terra quando o MST invadiu a fazenda do presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2002. Para Maria, a saída seria a prometida reforma agrária:

- A reforma precisaria estar num processo bem mais acelerado.

O governo Lula fez um dos maiores cortes da história no orçamento da reforma agrária. O número de famílias assentadas este ano deve ficar em um terço da meta. Lula prometeu assentar 115 mil famílias por ano, mas não deve chegar a 35 mil até dezembro, segundo o MST.

O crime organizado e a incapacidade dos governos de intermediar conflitos foram abordados pela especialista. Segundo Maria, há estudos identificando quem são, como são e onde estão os armamentos no campo em Pernambuco. As armas são usadas por milícias privadas, contratadas por fazendeiros. Para Maria, falta pessoal no governo capacitado para intermediar conflitos, reduzindo a capacidade de dar respostas aos anseios dos sem-terra. As polícias, para ela, nem sempre respeitam os direitos humanos nas operações de despejo.

Segundo ela, os sem-terra não se sentem seguros para procurar ajuda em delegacias de polícia, nas prefeituras e outros órgãos públicos, pela falta de neutralidade.

Os movimentos sociais se mobilizam. O MST divulgou ontem uma carta, assinada pelo presidente da Comissão Pastoral da Terra, dom Tomás Balduíno, pedindo dinheiro aos internautas para financiar uma marcha entre Goiânia e Brasília, em abril. No início do mês, o MST divulgara outra carta de dom Tomás pedindo dinheiro a religiosos, sem que o bispo tivesse conhecimento do texto.