Título: E o 15, que não é de Raquel?
Autor: José Sarney
Fonte: Jornal do Brasil, 18/03/2005, Outras Opiniões, p. A9

Todos relembram os 20 anos de redemocratização do Brasil, 15 de março de 1985. Mas ninguém fala do 15 de março de 1990, há 15 anos. Saía sob forte crítica da mídia

Raquel de Queiroz marcou a literatura brasileira, quando com O Quinze entrou com todo vigor no grupo daqueles que Osvald de Andrade chamou ''os búfalos do Nordeste'', que invadiram a Semana da Arte Moderna com a temática das secas.

Quando fui candidato a senador, nessa confusão de números que passaram a ser as eleições eletrônicas, eu era o 15. Perdi o nome. Era sempre ''vote no 15''.

Agora todos relembram os 20 anos de redemocratização do Brasil, 15 de março de 1985. Mas ninguém fala do 15 de março de 1990, há 15 anos. Eu passava o governo a Fernando Collor. Sua mãe, Leda Collor, filha de Lindolfo Collor e portanto conhecedora de eleições, dizia: ''foi uma eleição limpa, bem presidida pelo atual presidente da República''.

Saía sob forte critica da mídia. Duas coisas eram muito batidas: ''fez tudo para prorrogar seu mandato de 4 para 5 anos''; ''a inflação é a maior da história, 80%''.

Os gregos diziam que as coisas são boas quando terminam bem e se procurava passar a imagem de que terminara mal. Mas a verdade, esta que o tempo constrói, era bem outra. Não deixávamos nenhuma hipoteca para o futuro governo. Encontrei as finanças com déficit de 2,58% e deixei uma superávit primário de 0,8%, o que mostra o equilíbrio das contas públicas. A dívida externa que era de 123 bilhões fora reduzida a 99 bilhões de dólares, caíra de 37, 5% para 24, 8% do PIB. O Brasil que era a oitava economia industrial passou a ser a sétima. Não tínhamos dívida interna significativa. A carga tributária era de 24% do PIB, hoje é de 39%. A renda per capita, que em 1984 era de 1.468 dólares, em 1989 era de 2.923, e hoje, quinze anos depois, diminuiu para 2.789. O PIB cresceu 119% no meu governo. No de Collor, 30% e no do FHC caiu 15, 49%. São dados da FGV.

Mas se disse que a década de 1980 foi a década perdida. O crescimento da América Latina naquela década só não foi negativo por causa do crescimento do Brasil no período de 85 a 90. Nosso superávit de exportação era o 3o do mundo, depois do Japão e Alemanha. A taxa de desemprego foi de 2,36%, a menor de todos os tempos. Até hoje, 15 anos depois, estes números não foram repetidos nem alcançados.

O mandato de 5 anos? Quando assumi, recebi do Congresso uma ata na qual o mandato de Tancredo e o meu estão fixados em seis anos. Vem a Constituinte e abre-se a discussão. Achando que era desprendimento, propus a diminuição do meu mandato de um ano. Criaram na opinião pública a idéia de que queria prorrogar meu mandato em um ano. Assim, perdi um ano e espalharam que ganhara um mais! É que todos queriam antecipar a eleição, julgando que iriam ganhá-las. Coisas da política.

Quanto à inflação, com os números macro econômicos bons, mantinha-se nos parâmetros das inflações com correção monetária, muito diferente das sem correção. Como calculamos o PIB, a renda per capita em dólares, pedi à Tendências Consultorias que calculasse a inflação do meu governo em dólares, isto é, a verdadeira: média de 17,3% ao ano. A disparada dos últimos meses não era mais minha, era das expectativas criadas pela eleição. O tal medo do Lula e do tiro único que o presidente Collor prometera para matar o dragão da inflação. O mesmo que aconteceu na última eleição, quando o risco Brasil foi para a estratosfera.

Tudo passou. Como se diz no Nordeste, ''galho verde é que faz fumaça''. 15 anos depois, acabaram-se os galhos e a fumaça.