Correio Braziliense, n. 20617, 03/11/2019. Política, p. 4

"Para evitar adulteração"
Vera Batista


O presidente Jair Bolsonaro disse ontem que pegou a gravação das ligações da portaria do Condomínio Vivendas da Barra, no Rio de Janeiro, onde tem uma casa, para que não fossem adulteradas. A gravação possui áudios com registros da comunicação entre a portaria do condomínio e suspeitos de matar a vereadora Marielle Franco (PSol-RJ) no dia do assassinato. adora  “Nós pegamos, antes que fosse adulterado, ou alguém tentasse adulterar. Pegamos lá toda a memória da secretária eletrônica. Tudo que é guardado há mais de ano. A voz não é a minha, não é o seu Jair”, disse. Ele afirmou, ainda, que desconfia que o porteiro do condomínio “leu sem assinar” ou o induziram a “assinar aquilo, entre aspas”.

Bolsonaro se referia ao depoimento do porteiro que consta do processo que investiga a morte da vereadora e do motorista Anderson Gomes. Segundo reportagem do Jornal Nacional, exibida na terça-feira da semana passada, um porteiro do condomínio contou à polícia que, horas antes do crime, o ex-policial militar Élcio de Queiroz, suspeito de matar Marielle, esteve no local e disse que iria à casa 58 (que pertence a Bolsonaro), e que o “seu Jair” atendeu ao interfone e autorizou a entrada.

Witzel

O presidente voltou a acusar o governador do Rio de Janeiro. “Agora, quem está por trás disso? O governador Wilson Witzel, que só se elegeu graças ao meu filho, (senador) Flávio Bolsonaro, que colou nele o tempo todo. Um mês depois, virou inimigo nosso. Começou a usar a máquina do estado para perseguir o Flávio, o Carlos, agora, e o Hélio Negão”, afirmou. O governador, assim, teria, no entendimento de Bolsonaro, agido movido por uma “obsessão” em ser presidente da República. “É um obstáculo que tem que ser vencido”.

Para o presidente, Witzel teria se aproveitado do cargo para ter acesso a documentos sigilosos em um processo que corre em segredo de Justiça. “(Witzel) Não podia ter acesso a um processo em segredo de Justiça. Mais do que isso, né? A minha convicção é de que ele agiu no processo para botar meu nome lá dentro”, declarou.

Não é a primeira vez que Bolsonaro acusa o chefe do Executivo estadual fluminense de vazar as informações do processo para atingi-lo e, ao mesmo tempo, se credenciar para uma disputa à Presidência da República, em 2022. Ontem, também denunciou o delegado da Polícia Civil responsável pelo caso Marielle de ser “amiguinho” do governador. Lembrou, ainda, que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, foi acionado e explicou ter sido o auxiliar a entrar em contato com o procurador-geral da República, Augusto Aras, para tratar do caso, não ele. “Eu não trato isso com o Aras. Não tem cabimento, o tratamento com Aras foi via ministro da Justiça”, afirmou.

O governador do Rio, por sua vez, não respondeu, ontem, às declarações de Bolsonaro. Na sexta-feira, contudo, refutou a tese do presidente de que esteja por trás da citação do nome do presidente nas investigações e parabenizou a Advocacia-geral da União (AGU) por ter aberto um procedimento para investigar o vazamento da informação ao Jornal Nacional sobre o depoimento do porteiro à Polícia Civil. “Seja ele de farda, de distintivo, político, filho de poderoso. Não tenho compromisso com a bandidagem. Assumi o estado sem qualquer compromisso com traficante, com miliciano. Todos aqueles que se colocarem na reta da Justiça serão presos, serão investigados”, afirmou.

Agenda econômica

O presidente comemorou a queda na taxa básica dos juros, que está em 5% ao ano, a mais baixa da história e previu que  a Selic pode chegar a 4,5% ao ano até o fim do ano. “No nosso governo. Pela segunda vez, a mais baixa taxa de juros da história do Brasil”, comemorou. O presidente alfinetou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “O Fernando Henrique foi simplista combatendo a inflação, aumentando a taxa de juros”, afirmou.

Bolsonaro também comemorou a queda da taxa de desemprego, de 11,8% no trimestre terminado em agosto, abaixo dos 12,3% registrados no trimestre anterior e comentou a inflação abaixo da do centro da meta, de 4,25%.

O presidente disse que, talvez, vá ao Congresso na terça-feira, para apresentar o pacote econômico, que inclui, também, medidas de distribuição de recursos entre a União, os estados e os municípios, e propostas de estímulo ao emprego por meio de desonerações a empregadores que contratarem trabalhadores em busca do primeiro emprego entre 18 e 29 anos, e na faixa de 55 anos ou mais. Sobre a reforma tributária, ele disse que “é muito importante”, mas não se comprometeu a dizer qual vai enviar primeiro ao Congresso.