Título: A justiça que falha porque tarda
Autor: Daniela Dariano
Fonte: Jornal do Brasil, 20/03/2005, País, p. A8

Demora para julgar e excesso de recursos fazem ações eleitorais perderem o sentido. No Rio, 245 processos de 2004 aguardam apreciação

Há menos de um mês, numa das duas sessões semanais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio, o pedido de um advogado causou mal-estar entre os juízes. Ele solicitava a extinção de uma ação de 2000 contra o então vice-prefeito eleito de Macaé, Ricardo Meirelles. O requerimento foi aprovado por unanimidade devido à extinção do objeto - os administradores da cidade já eram outros há quase meio ano.

Este não é um caso isolado. Só do pleito municipal passado no estado, segundo a assessoria do TRE, 245 ações ainda estão tramitando, muitas à espera do primeiro julgamento e com possibilidade de serem levadas ainda até ao Tribunal Superior Eleitoral. Grande parte dos processos é pela cassação de diplomas de eleitos, pedido que tem data de validade: os quatro anos do mandato.

O presidente do TRE, Marcus Faver, declarou-se envergonhado diante da extinção da ação em Macaé, depois de cinco anos tramitando sem julgamento. Fez um apelo para que as apreciações sejam aceleradas. Pretende deixar a presidência do tribunal, em 11 de maio, quando termina seu mandato de dois anos, sem nenhuma ação atrasada.

De norte a sul do estado, as ações na Justiça eleitoral referem-se principalmente a acusações de compra de votos e uso da máquina pública - do Estado e da prefeitura. O processo eleitoral em Campos dos Goytacazes é exemplar. São ao todo seis ações judiciais contra o prefeito eleito, Carlos Alberto Campista (PDT), e o segundo colocado no pleito, Geraldo Pudim (PMDB). Antes mesmo do resultado da eleição, os cientistas políticos antecipavam: haveria terceiro turno, nos tribunais. Os estudiosos, porém, parecem ter sido muito otimistas. Previam uma decisão da Justiça - que ainda não houve - no mês seguinte ao pleito de outubro.

Faver atribui a demora ao ''emaranhado da legislação eleitoral, que permite sucessivos recursos sobre uma mesma questão''.

- Uma ação é julgada uma, duas, três vezes. Entram com agravo de instrumento, e o processo fica paralisado. Depois vêm os embargos. A legislação permite a interposição de inúmeros recursos que poderiam ser extintos - critica.

Campos, segundo Faver, é um dos casos que já poderiam ter sido julgados, mas custa a ter definição devido ao uso, pelos advogados, de todas as brechas do labirinto judicial.

O município de Vassouras também vive um impasse, depois do pleito em que o candidato do PMDB à reeleição, Altair Paulino, saiu vencedor por uma diferença de 172 votos (de 26 mil, ao todo). Mas não foi nas urnas que a disputa acabou. Ou melhor, a briga não terminou. Hoje, há 15 processos - entre pedidos de cassação de diploma, cautelares, recursos e mandado de segurança - no TRE. Há 80 dias, o segundo colocado no pleito, Eurico Pinheiro Bernardes Junior (PV), aguarda o julgamento de um mandado de segurança.

Segundo ele, o PV interpôs seis processos de cassação contra Altair Paulino. Um, por recebimento de verba do governo estadual para aquisição de equipamento hospitalar e uso desse mesmo dinheiro para pagar funcionários do hospital nos três meses que antecederam as eleições. Outro, por receber verba do estado e asfaltar mais de 30 ruas no período proibido pela legislação eleitoral. O terceiro, por iniciar a construção de 100 casas quando já estaria impedido por lei.

No quarto processo, o PV acusa o prefeito de distribuir, através de candidatos a vereadores da coligação, cestas básicas acompanhadas de R$ 50. O cadastramento teria ocorrido também no período eleitoral, caracterizando captação ilegal de votos. As duas outras ações tratam: uma, da participação de Altair Paulino em inauguração e comício no mesmo local poucas horas depois e, supostamente, usando a máquina da prefeitura, e a outra, do uso de recursos municipais e do slogan da prefeitura - ''muito já foi feito, muito temos a fazer'' - na campanha.

O prefeito reeleito foi condenado nos seis processos a perder o mandato. Em 17 de dezembro, então, Eurico Junior foi diplomado. Mas a história só estava começando.

- Dia 20 de dezembro, entraram com cautelar para barrar minha diplomação - conta.

Negada a cautelar, foram interpostos quatro agravos regimentais, também negados, e um mandado de segurança, negado uma vez e depois, reconsiderado por desembargador do TRE. O diploma de Eurico foi cassado e o peemedebista foi diplomado. Mesmo assim, para que o caso seja dado como encerrado, é preciso que o mandado de segurança seja votado em plenário.

- O Ministério Público, dia 19 de janeiro, opinou pela denegação do mandado. Mas teve recesso até 1º de fevereiro. E o relator ainda não botou em votação no plenário - queixa-se Eurico.

Segundo funcionários do gabinete do prefeito de Vassouras, procurado pelo Jornal do Brasil na sexta-feira, ele estava em viagem e incomunicável devido a defeito em seu aparelho celular. O advogado do prefeito também não retornou os telefones do JB.