Título: O planeta e o desafio do futuro
Autor: Antônio Ermírio de Moraes
Fonte: Jornal do Brasil, 20/03/2005, Outras Opiniões, p. A13

Quando leio os demógrafos, tento visualizar como será o mundo dos que estão nascendo hoje. Daqui a 50 anos, eles serão pais e muitos terão netos. De que forma estarão vivendo?

Os demógrafos nos dizem que, em 2050, o planeta Terra terá mais de 3 bilhões de habitantes. A população mundial ultrapassará a casa dos 9 bilhões de seres humanos.

Na opinião de Malthus, os habitantes da Terra multiplicar-se-iam a uma taxa muito superior à disponibilidade de recursos. Seria uma catástrofe. Sua previsão falhou por não prever o espetacular desenvolvimento da ciência e o aumento da eficiência na produção de alimentos e outros bens.

Mas será que essa eficiência será mantida nos próximos 50 anos? É bem provável que sim, a despeito de certos recursos que estão se esgotando, como é o caso da terra agricultável e da água.

Mas os problemas do mundo dos nossos netos e bisnetos serão diferentes. Eles viverão no meio de um crescimento perigosamente desequilibrado entre os povos. Sim, porque dois terços dos novos moradores do planeta - cerca de 2 bilhões de habitantes - terão de ser alimentados e educados em nações pobres em recursos.

As projeções demográficas mostram uma verdadeira dança das cadeiras entre os países em matéria de população. Os países ricos encolherão sua população. A China que tem 1,3 bilhão de habitantes ficará em torno disso em 2050, ocupando o segundo lugar no ranking mundial. A Índia, que tem 1 bilhão, terá mais de 1,5 bilhão de pessoas (50% de aumento), passando para o primeiro lugar. O Paquistão, que atualmente têm 143 milhões de habitantes, terá 350 milhões (mais de 100% de aumento). A Nigéria saltará de 115 milhões para 258 milhões. E Bangladesh passará de 138 para 255 milhões (Lester Brown, Outgrowing the Earth, New York: W.W.Norton & Company, 2004).

Em 1950, os países mais pobres tinham apenas 8% da população mundial e os mais ricos, 32% (os demais estavam em países de desenvolvimento médio). No ano 2000, essas proporções já haviam se alterado para 11% e 20%, respectivamente. E em 2050, serão 19% e 14%. Ou seja, a explosão demográfica terá como cenário os países mais pobres.

O Brasil crescerá moderadamente, passando dos atuais 180 milhões de habitantes para 233 milhões em 2050 - e, graças a Deus, temos recursos abundantes. Mas é aí que mora o perigo. A demanda exagerada por recursos inexistentes sempre provocou conflitos entre os povos. A história pode se repetir. Gigantes como a China e a Índia, por exemplo, e, em menor escala, o Paquistão e a Indonésia, poderão ser levados a pressionar os países de recursos abundantes.

Isso significa dizer que nem mesmo um bom estoque de recursos pode garantir a paz no mundo do futuro. Oxalá as previsões dos demógrafos possam ser temperadas com algo diferente para se evitar as catástrofes em que se transformaram as guerras do passado.

Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos para o JB