O Globo, n. 31544, 18/12/2019. Rio, p. 17

Entrevista: Roberto Saturnino Braga

Roberto Saturnino Braga


Em 15 de setembro de 1988, o então prefeito Roberto Saturnino Braga anunciou a falência do município em um pronunciamento de TV. Naquela época, após anos de dificuldades fiscais, a cidade ficou com recursos praticamente zerados após o Banco Central determinar o bloqueio de todas as contas da prefeitura. Saturnino, então, em meio a disputas políticas e à falta de apoio do governo federal, optou pelo pedido de falência para tentar obter ajuda financeira para pagar salários e fornecedores. Em entrevista ao GLOBO, o ex-prefeito, hoje com 88 anos, sugeriu que o prefeito Marcelo Crivella — que vem negando a dimensão da crise — faça um chamamento público por socorro.

Como o senhor recebeu a notícia de que Crivella suspendeu os pagamentos?

Já passei por isso. A gente fica preso, porque, se não tem receita, de onde vai tirar? Na minha época, não tive facilidade, precisei me virar, pagando parceladamente. Mas o funcionalismo entendeu e acabou tudo bem. Todas as crises têm semelhanças. Quem assume função pública precisa estar preparado para isso e se virar com os recursos disponíveis.

Qual a explicação para a crise ter chegado a este ponto?

Não acompanho de perto os números da prefeitura, então seria leviano da minha parte fazer julgamento sobre competência ou não do Crivella. Não sei se foi má gestão ou consequência da economia.

O senhor se arrepende de algum ato na crise de 1988?

Sim, o isolamento político foi um erro meu. Naquele momento, eu tinha me indisposto com o Brizola (Leonel Brizola, governador à época), e rompi com PDT (legenda pela qual se elegeu). Já estava no PSB, que era então um partido pequeno, sem tanta força política.

Mas hoje o prefeito possui mais apoio político. Como poderia usá-lo a seu favor?

Eu convocaria uma entrevista para expor a situação e pedir o socorro. De certa forma, os governos federal e estadual têm responsabilidade com o Rio. É preciso um gesto político, um chamado político de socorro, inclusive convocando a população, e tentar fazer com que haja compreensão. É preciso juntar forças, cedendo um pouco aqui e outro ali.

O senhor vê algum componente político na crise de 1988?

Não digo que o governo federal era contra o Rio, ou que tenha sido culpa do Sarney (José Sarney, presidente), mas houve uma conjunção de forças. Como o BC passa um telegrama a todos os bancos proibindo qualquer financiamento ao Rio? Claro que foi um gesto político.

O senhor acompanha o cenário político atual?

Sempre participo de debates e escrevo meus artigos. Diretamente não participo mais, mas há 15 dias me filiei de novo ao PSB (estava no PT). Não serei mais candidato, mas quero encerrar vida política no meu partido de coração.