Título: ONG ataca missão do Brasil
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Fonte: Jornal do Brasil, 24/03/2005, Internacional, p. A7
Polícia local, desarmamento e direitos humanos são principais pontos do texto, refutado por comandante brasileiro
AFP O secretário e o presidente Lula discutiram o papel do Brasil na estabilidade política na América Latina
BRASÍLIA e WASHINGTON - A missão de paz das Nações Unidas no Haiti (Minustah), liderada pelo Brasil, foi avaliada como ineficiente na promoção da estabilidade política e social no país, em relatório divulgado ontem pela organização não governamental Justiça Global e pelo Programa de Direitos Humanos da Faculdade de Direito de Harvard.
''Depois de 8 meses sob o comando da Minustah, o Haiti é tão inseguro quanto sempre foi'', afirma o documento.
Para o diretor da Justiça Global, James Cavallaro, a resolução da ONU estabelece três eixos principais de atuação para a Minustah: desarmamento; reforço institucional como forma de garantir o processo político; e realização de relatórios sobre direitos humanos. Na avaliação de Cavallaro, nenhum desses aspectos está sendo cumprido.
O problema da missão, segundo ele, é resultado de uma interpretação tímida da resolução do Conselho de Segurança, que definiu o mandato da Minustah.
- Avaliamos o mandato, comparando-o com vários outros de forças de paz e a conclusão é muito clara: esse mandato é muito forte, dá competência às autoridades da Minustah, que é a força de paz no Haiti - disse Cavallaro.
Segundo o relatório, a missão de paz está sendo omissa na investigação de denúncias de abuso dos direitos humanos por parte da Polícia Nacional Haitiana (PNH).
''A Minustah efetivamente deu cobertura para que a PNH levasse adiante uma campanha de terror nas favelas de Porto Príncipe'', diz o documento.
O desarmamento dos civis e dos ex-militares também não está sendo cumprido. Cavallaro contou que, durante a visita que fizeram ao Haiti, os pesquisadores viram ex-militares andando armados pelas ruas. Em Petit Goave, eles estão no comando da delegacia de polícia.
Na missão de paz em Serra Leoa, África, foram desarmados, segundo o relatório, cerca de 47 mil combatentes. Já na Libéria, também na África, estima-se que entre 21% e 24% das armas tenham sido recolhidas pelos capacetes azuis, em um ano de atividade. No Haiti não há estatísticas.
- O número de armas recolhidas não tem significado, é estatística que não resolve nada - afirma o comandante da missão no Haiti, o general brasileiro Augusto Heleno. - O que adianta é desarmar o espírito. Se as pessoas não estiverem dispostas a se desarmar, se não houver uma outra situação no país, nós vamos desarmar e daqui um mês tem novos grupos armados e armas até mais novas dentro do país.
Para o relatório, no entanto, ''a falha da Minustah em desarmar é decididamente o produto de falta de vontade política, e não de um mandato fraco''.
Mesmo com as críticas, o relatório traz uma visão otimista e afirma que ainda há tempo para que a Minustah consiga estabelecer a paz, dando condições para a realização das eleições marcadas para o fim de 2005.
''Mantemos nosso entendimento de que a missão abriga enorme potencial para promover o Estado de Direito, respeito aos direitos humanos fundamentais, e desenvolvimento econômico e social no Haiti'', afirma o documento.
O relatório apresenta recomendações para que a Minustah consiga atingir os objetivos estabelecidos, como a promoção do desarmamento e a realização de relatórios sobre a violação de direitos humanos.
O documento sugere também ações como o uso de tropas de paz para garantir a segurança nos hospitais. Várias denúncias foram feitas sobre o desaparecimento de pessoas internadas depois de serem feridas pela própria polícia haitiana.