O Estado de S. Paulo, n. 46914, 29/03/2022. Economia & Negócios, p. B1

Bolsonaro demite chefe da Petrobras e indica ao cargo nome pró-mercado

Adriana Fernandes


 

O presidente Jair Bolsonaro demitiu ontem Joaquim Silva e Luna da presidência da Petrobras. Sob fritura há semanas desde a explosão de preços dos combustíveis com a guerra na Ucrânia, o general da reserva do Exército estava havia apenas um ano no cargo. Será substituído pelo diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.

A escolha de Pires, o terceiro presidente no governo Bolsonaro, foi interpretada como sinalização pró-mercado financeiro, cujos investidores cobram a manutenção da política de reajuste de preços da Petrobras, que segue a tendência dos preços do mercado internacional.

O nome foi costurado pelo próprio ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que trabalha pela adoção de um subsídio temporário do governo para diminuir a alta de preços dos combustíveis, considerada o calcanhar de aquiles de Bolsonaro nas eleições deste ano. Com a entrada de Pires, a proposta de subsídio, rejeitada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, deve ganhar fôlego.

Bolsonaro tem sido apontado como culpado pela população pelos altos preços e gasolina e ensaiou um movimento, após a disparada de preços do petróleo, de intervenção de preços da Petrobras. Por isso, ainda há desconfiança de que ele vá continuar pressionando.

Segundo apurou o Estadão, a diretoria atual da empresa gosta das posições de Pires. A transição deve ser suave. Nesse primeiro momento, a expectativa é de que não haja tantas mudanças como ocorreu, no ano passado, na troca de Roberto Castelo Branco por Silva e Luna. A leitura inicial é de que ele vai continuar com a política de preços de paridade internacional e que o presidente com a troca “fez mais um showzinho para o eleitorado” com os ataques à ação da estatal de olho nas eleições.

Resistência. O presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, indicado para a presidência do conselho administrativo da empresa, era também cotado, mas foi preterido por ser visto por integrantes da empresa da indústria de óleo e gás como alguém disposto a “fazer tudo”, inclusive aceitar uma intervenção do governo nos preços, como defende integrantes do governo nos bastidores.

Pires tem defendido o subsídio e se manifestado contrário ao projeto 1474, que trata de preços de combustíveis e prevê fundo de amortização dos preços, já votado no Senado e em tramitação na Câmara. Mas permanece certo ceticismo de que segurará a pressão do presidente para intervir nos preços em ano eleitoral.

‘Coincidência’. A confirmação da saída de Silva e Luna, que já era dada como certa há pelo menos 10 dias em Brasília, como mostrou o Estadão no dia 17, coincidiu com a decisão tomada no mesmo dia em que o ministro da Educação, Milton Ribeiro, entregou o cargo ao presidente.

Ribeiro é investigado por suspeita de envolvimento com pastores que cobravam propina para intermediar recursos para escolas, como revelou o Estadão. Essa tentativa de tirar o foco de uma notícia negativa é uma estratégia já usada por Bolsonaro em outros momentos de pressão ao longo dos mais de três anos de mandato na Presidência.

Os nomes de Pires e Landim precisam ser aprovados pela assembleia de acionistas no dia 13. O mandato do atual presidente da Petrobras vai até março de 2023, mas isso não impede a substituição.

Além de Pires e Landim, o Ministério de Minas e Energia confirmou a indicação de outros nomes para o conselho de administração: Sonia Julia Sulzbeck Villalobos, Luiz Henrique Caroli, Ruy Flaks Schneider, Márcio Andrade Weber, Eduardo Karrer e Carlos Eduardo Lessa Brandão.

Com a queda, Silva e Luna deve deixar de ganhar um salário anual em torno de R$ 2,9 milhões (R$ 223 mil por mês), segundo dados do Ministério da Economia. De acordo com as regras atuais, o presidente da estatal pode receber até 13 salários de bônus caso todas as metas sejam atingidas.

O desconforto do presidente com a alta de preços e a falta de ação atribuída à Petrobras pavimentou a queda de Silva e Luna. O general da reserva do Exército foi alçado à presidência da Petrobras em abril passado no lugar de Roberto Castelo Branco com a expectativa de aliados de que faria mudanças na política de preços. •