O Globo, n. 31522, 26/11/2019. Rio, p. 11

Combate à violência: Estatísticas de extremos
Giampaolo Braga
Felipe Grinberg


A pouco mais de um mês para o fim do ano, os números da política de combate à violência do governador Wilson Witzel deixam o Rio entre extremos. As estatísticas divulgadas ontem pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram, de um lado, uma queda contínua de homicídios dolosos, roubos de veículos e latrocínios e, de outro, um novo recorde de mortes em confrontos. Num dia de operações na Cidade de Deus e no Complexo da Maré — com três óbitos —, o ISP anunciou que, entre janeiro e outubro deste ano, houve 1.546 casos de pessoas mortas em trocas de tiros com a polícia, o que dá cinco ocorrências deste tipo por dia. O número é o mais alto registrado em todos os anos desde 1998, início da série histórica no estado.

Num outro recorte, as mortes em confrontos também disparam: foram 13% de casos a mais em outubro deste ano, em comparação com o mesmo mês de 2018. Ao divulgar os dados, o governo estadual destacou, no entanto, que o indicador, alvo de críticas de especialistas contra a alta letalidade da polícia, tem caído nos últimos três meses. Em relação a setembro, a queda foi de 6%.

CRÍTICA DE ESPECIALISTA

Para o cientista político Pablo Nunes, coordenador de pesquisas da Rede de Observatórios da Segurança, o número menor de homicídios está relacionado a uma tendência nacional de queda desse tipo de crime, e não pode ser atribuído à política de governo.

— Em anos anteriores, uma série de conflitos entre facções acabou levando a uma alta muito grande das estatísticas de homicídios. Estamos em um momento mais calmo — analisa Nunes, acrescentando que as mortes em confrontos também sofrem influência do discurso de Witzel. — O governador diz que tolera a letalidade. Criou-se então um ambiente em que policiais se sentem menos pressionados a evitar confrontos.

No outro extremo, os homicídios dolosos no estado tiveram uma redução de 21% nos dez primeiros meses de 2019, na comparação com o mesmo período de 2018. Foram 3.342 vítimas este ano, contra 4.226 no anterior. É o menor número registrado desde 1991,

quando os dados começaram a ser coletados. Na comparação entre outubro deste ano e do ano passado, a queda também foi acentuada: 17%.

Os latrocínios — roubos seguidos de morte — também vêm caindo. Nos dez primeiros meses do ano, houve 91 ocorrências, 36% a menos do que em 2018. O índice é o menor desde 1991.

Os roubos de veículos diminuíram 29% na comparação entre outubro deste ano e o mesmo mês de 2018. Foram 3.027 casos no mês passado. No acumulado do ano, o recuo é de 24%, o menor percentual desde 2017. Os roubos de rua (a transeunte, em coletivo e de celular) caíram 15% em relação a outubro de 2019, com 1.344 casos a menos. A queda cumulativa em 2019 é de 6%. Os roubos de cargas, um dos focos da política de segurança de Witzel, voltaram a cair em outubro, quando o número ficou 11% abaixo do registrado no mesmo mês em 2018. Ao longo do ano, a redução foi de 18%, ou 1.344 casos a menos. No município do Rio, a maior diminuição foi constatada nas regiões de Olaria e adjacências e de Irajá e bairros vizinhos.

Por outro lado, há estatísticas de crimes que têm crescido. Os casos de roubos em ônibus totalizam o maior número de janeiro a outubro desde 1991. Os roubos de celulares também bateram recorde, com os maiores índices registrados desde 2001 (início da série histórica para esse indicador).

Até outubro, as polícias Civil e Militar apreenderam 7.215 armas de fogo, o que dá uma média de 24 retiradas das ruas diariamente. Desse total, 468 foram fuzis, o que totaliza mais de uma arma desse tipo recolhida por dia. O total apreendido em 2019 é o maior dos últimos 12 anos.

WITZEL COMEMORA

Pelas redes sociais, Witzel afirmou que a política de segurança de seu governo tem mostrado, “mês após mês, que está no caminho certo”: “Muitas vidas foram salvas pela atuação das nossas forças de segurança. Sempre acreditei que, ao dar autonomia e recursos às polícias, os resultados iam surgir. É assim que vamos seguir”. Ele comemorou a queda de índices importantes, mas não se pronunciou sobre o aumento das mortes em confrontos.

As mortes por intervenções policiais tiveram alta em áreas de 46 delegacias — as chamadas Circunscrições Integradas de Segurança Pública (Cisps). Os maiores aumentos foram na área da 151ª DP (Nova Friburgo), que passou de um caso, entre janeiro e outubro de 2018, para cinco, este ano. Na região da 19ª DP (Tijuca), subiram de quatro para 20, e, na área da 33ª DP (Realengo), de sete para 34.

O antropólogo e especialista em segurança pública Paulo Storani, ex-oficial do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM acredita que algumas regiões precisam de uma atuação mais ostensiva da polícia:

— Quem está morrendo hoje é o criminoso, mas não adiantar só isso. Caso contrário, em oito, dez anos, teremos jovens entrando para o crime da mesma forma que acontece hoje. Além disso, a política de confronto aumenta a possibilidade de erro policial. Precisamos diminuir o risco de inocentes serem baleados.