Título: Americanos decidem futuro da Alca
Autor: Gisele Teixeira
Fonte: Jornal do Brasil, 14/04/2005, Economia, p. A20

Governo dos EUA já sofre forte pressão para desistir de acordo de livre-comércio com América Central

WASHINGTON - O futuro da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) está cada vez mais nebuloso e bem menos ligado à habilidade dos diplomatas brasileiros. A retomada das negociações depende agora de dois assuntos que tramitam no Congresso americano. O primeiro é a renovação da Trade Promotion Authority (TPA), o chamado fast track, aprovado em 2002 e que vence este ano. O mecanismo permite que o presidente George W. Bush assine acordos comerciais sem submetê-los aos parlamentares. A tendência é que o governo consiga prorrogar a TPA até 2007.

O segundo tema é bem mais espinhoso. Os congressistas precisam aprovar o acordo assinado pelos Estados Unidos com os países centro-americanos e a República Dominicana (Cafta), que representam menos de 1% do comércio exterior dos EUA. E, neste caso, há enorme resistência de setores protecionistas. Será o primeiro teste do novo diretor do poderoso United States Trade Representative (USTR), Rob Portman, indicado por Bush, mas ainda não confirmado pelo Senado.

A briga não será fácil, apesar de o governo Bush possuir maioria no Congresso. Segundo avaliação do embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdenur, uma derrota neste tema colocaria em jogo não só a Alca, mas toda a agenda de negociações comerciais dos EUA.

No Relatório de Barreiras 2005, documento divulgado na última semana, Abdenur oferece um exemplo ilustrativo do que acontece. Ele destaca que no caso do açúcar, um dos poucos produtos em que os países da América Central poderiam fazer diferença no mercado americano, o aumento das quotas de exportação foi muito modesto.

- E mesmo este discreto resultado tem sido suficiente para levantar dúvidas sobre a possibilidade de aprovação do acordo - destaca.

No caso do Brasil, o embaixador lembra que qualquer negociação comercial com os EUA implicaria em ''mexer'' com o poderoso lobby do açúcar, e grupos ligados ao tabaco, etanol, suco de laranja e carne bovina.

Lori Wallach, diretora da organização não-governamental Global Trade Watch (GTW), que trabalha contra a Alca, não acredita na aprovação do Cafta. Ela lembra que o governo americano assinou o documento há mais de um ano, mas ainda não o apresentou ao Congresso por ter a certeza de que será derrotado. Segundo ela, os produtores agrícolas estão escaldados com o Nafta, acordo entre EUA, Canadá e México, e farão enorme pressão contra a assinatura do Cafta.

Lori destaca que desde a criação do Nafta, há 11 anos, a cesta básica aumentou 23% e o país passou a importar alimentos. Sendo que em 2004, pela primeira vez, as importações superaram as exportações.

- Os produtores estão sentindo na pele os efeitos do Nafta e não querem mais do mesmo - diz. Em março, a Associação Nacional dos Departamentos Estaduais de Agricultura dos EUA adotou uma posição oficial contrária ao Cafta.

O momento não é bom para o setor agrícola. O governo Bush propôs um corte de US$ 5,7 bilhões nos programas agrícolas para os próximos dez anos, como parte de um pacote de redução de déficit. A Comissão Orçamentária da Câmara dos Deputados defende corte de US$ 5,3 bi e o Senado quer baixar este valor para US$ 2,8 bi. A decisão sobre de quanto será a redução e quais os projetos atingidos será tomada este ano. Bush quer um corte geral de 5%, em todos os segmentos, e um teto de US$ 250 mil para a ajuda aos maiores produtores. Os agricultores não param de reclamar. A receita agrícola tem crescido nos últimos dois anos, mesmo assim o Congresso destinou US$ 130 bilhões em subsídios em menos de uma década.