Correio Braziliense, n. 21374, 22/09/2021. Política, p. 2

Entre elogios, críticas e surpresa zero.



O discurso do presidente Jair Bolsonaro causou as reações esperadas no meio político. Se, para uma parcela expressiva do Congresso o presidente apenas repetiu o que vem dizendo ao longo dos últimos meses, deixando de aproveitar um palco importante para reforçar a política externa, no campo oposto, o dos seus apoiadores, foi motivo de elogios porque deixou claro que seu governo não abre mão dos princípios que defende desde o primeiro dia.

“Falou o que já vem falando há muito tempo internamente no país. Falou de temas específicos, mas fez a visão com o detalhamento do Brasil, os aspectos de infraestrutura, meio ambiente, combate à pandemia e outras questões, mas de uma maneira que só ele pode avaliar”, analisou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Para o Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), Bolsonaro “destacou pontos importantes do Brasil. Obviamente que há posições do presidente das quais eu discordo, mas são convicções dele. Portanto, não há grandes surpresas em relação à fala”.

Já o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), repudiou a defesa de Bolsonaro ao tratamento precoce. “Após ver o que ocorreu em Manaus, ver o que a Prevent Senior fez com pacientes, o presidente foi ao órgão mais importante do mundo defender tratamento precoce. O presidente ouviu pitaqueiros, gabinete paralelo, e foi defender o que nenhum líder defende”, lamentou.

A base governista, por sua vez, viu no discurso a autenticidade de um governo comprometido com, a cidadania. Segundo o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), “o presidente mostrou a verdade. O Brasil é o quarto país do mundo que mais vacina. Nós estamos cuidando, ao mesmo tempo, da economia e da saúde dos brasileiros, a despeito de governadores que querem remar contra”.

O deputado Luiz Lima (PSL-RJ) acrescentou que “o presidente Bolsonaro fez um dos seus melhores discursos”. “Citou o combate à corrupção, sucesso na agricultura, na infraestrutura, empresas estatais que pararam de enviar recursos para o exterior. O povo era o principal financiador desses esquemas de fortalecimento do comunismo em outros países”, lembrou.

Filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) — que está na comitiva, em Nova York — reforçou que Bolsonaro “trouxe a verdade para todo o mundo, sem o filtro da mídia. Em seu discurso na Assembleia Geral da ONU, o presidente mostrou como a luta pela liberdade é o foco de seu governo”.

Pós-Trumpismo

Para estudiosos, o discurso do presidente evidencia que ele tenta, agora, ocupar um espaço que outrora foi do ex-presidente americano Donald Trump. “Bolsonaro reivindicou o manto pós-Trump como sendo o principal propagador de desinformação em face de uma pandemia mortal. Este discurso foi uma forma de sinalizar aos populistas de extrema direita em todo o mundo que ele é o líder de seu movimento”, afirmou Lincoln Mitchell, cientista político e professor da Universidade Columbia, em Nova York.

Já Márcio Coimbra, cientista político e coordenador do MBA em Relações Institucionais e Governamentais do Mackenzie em Brasília, ressaltou que o discurso de Bolsonaro foi como se estivesse em seu cercadinho no Palácio da Alvorada. “Ele se expôs ao ridículo quando ele fala de tratamento preventivo para a covid-19 — e a gente sabe que o caso da Prevent Senior está sendo algo muito debatido, porque é um crime”, ressaltou.

“Algumas falas foram muito mais para a torcida do bolsonarismo do que propriamente para poder recuperar o que é muito difícil de ser recuperado, que é a imagem internacional do Brasil nesses dois anos e meio de governo Bolsonaro”, disse Felipe Loureiro, professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP).

Embora Bolsonaro tenha tentado falar diretamente aos investidores para se aproximar deles, seu discurso terá efeito contrário. É o que acredita o professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Juliano Cortinhas. “Quando o Bolsonaro opta por falar para a sua base de apoiadores e não para a comunidade internacional, ele perde uma oportunidade imensa. A ONU não é um palco para ele falar para sua base de apoiadores. Os investidores internacionais estão observando os discursos, os outros líderes mundiais com os quais ele pode fechar acordos de cooperação estão observando essas falas”, alertou.

Leia em: https://www.cbdigital.com.br/correiobraziliense/22/09/2021/p2