Título: O nepotismo e a Constituição
Autor: LUIZ ORLANDO CARNEIRO*
Fonte: Jornal do Brasil, 02/04/2005, País, p. A5

O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), ao reagir às críticas de nepotismo explícito no Legislativo, em benefício de parentes seus e do segundo vice-presidente da Casa, Ciro Nogueira (PP-PI), disse que apoiaria uma emenda constitucional para impedir a prática, desde que a proibição atingisse também os outros dois Poderes da República. Ninguém mais agüenta a crescente tendência dos parlamentares de ''constitucionalizar'' qualquer questão de natureza corporativa, sem ao menos se dar ao trabalho de consultar o texto da Carta vigente há mais de 16 anos. O nepotismo é substantivo que não precisa, nem deve, aparecer no texto constitucional. Simplesmente porque, de acordo com a cláusula fundamental do artigo 37, ''a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios observará aos princípios de legalidade, impessoalidade e moralidade'', dentre outros.

No que sobrou do projeto de emenda constitucional da reforma do Judiciário, a ser novamente votado pela Câmara, está a proibição da nomeação de parentes por desembargadores e ministros de tribunais superiores para cargos em comissão.

Ora, a matéria refere-se basicamente aos princípios da moralidade e da impessoalidade e depende de ato regimental, como explica um ministro do Supremo Tribunal Federal, que cita como exemplo o próprio regimento interno da mais alta Corte do país.

Segundo o artigo 355 do regimento do STF, aprovado há mais de 20 anos, ''salvo se funcionário efetivo do tribunal, não poderá ser nomeado para cargo em comissão ou designado para função gratificada, cônjuge ou parente, em linha reta ou colateral, até terceiro grau, inclusive, de quaisquer dos ministros em atividade''.

O que se espera do Congresso não é nenhuma nova proposta de emenda constitucional (PEC), ou de uma ''PEC paralela'' - estranha e suspeita expressão que passou a ser usada no dia-a-dia do Parlamento.

O que se espera do Congresso é vontade política (no caso específico, nossos avós falariam de ''vergonha na cara'') para incluir a proibição do nepotismo nos regimentos internos da Câmara e do Senado.

E do Executivo - mais especificamente, na ''República petista'' - que siga à risca o Estatuto dos Servidores da União (Lei 8122/90), que veda ao agente público ''manter sob sua chefia imediata, em cargo de confiança, cônjuge, companheira ou parente até o segundo grau civil''.