O Globo, n. 31469, 04/10/2019. Rio, p. 10

Grupo acusado de dar sumiço à arma é preso

Chico Otavio
Vera Araújo
Letícia Gasparini


Elaine Pereira Figueiredo Lessa dormia num quarto com um de seus filhos quando policiais e promotores bateram à porta, pouco antes das seis da manhã de ontem. Logo em seguida, sua casa, que fica em um condomínio de luxo da Barra, passou a ser revirada: agentes começaram a cumprir ali o primeiro dos 27 mandados de busca e apreensão da Operação Submersus, cujo objetivo era colher provas de tentativas de obstrução da investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Preso numa penitenciária de segurança máxima em Porto Velho, o marido de Elaine, o sargento reformado da PM Ronnie Lessa, é acusado de ter praticado o crime, em 14 de março do ano passado.

A revista no imóvel durou quase duas horas. Elaine foi levada presa para a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), também na Barra. Ficará atrás das grades em caráter preventivo, assim como outras três pessoas detidas ontem: seu irmão Bruno Figueiredo; Márcio Mantovano, o Márcio Gordo; e Josinaldo Lucas Freitas, o Djaca. Segundo investigadores, há claros indícios de que o grupo se articulou para esconder o armamento usado no duplo homicídio.

A DHC e o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público acreditam que Elaine comandou uma ação para sumir com armas e munição do marido, para apagar qualquer tipo de prova que pudesse incriminálo. Acredita-se que uma submetralhadora HK-MP5, usada na execução de Marielle e Anderson, tenha sido jogada no mar, próximo às Ilhas Tijucas. A mulher de Lessa teria escolhido pessoas de confiança para a empreitada.

A investigação aponta que a primeira providência de Elaine foi mandar o irmão e Márcio Gordo buscarem caixas num apartamento de Lessa em um condomínio no Pechincha, em Jacarepaguá, após uma tentativa fracassada de retirada do material. Em 13 de março deste ano, quatro homens com camisetas da Polícia Civil chegaram ao local em um Palio com placa clonada, mas não conseguiram entrar: o síndico exigiu a apresentação de um mandado de busca e apreensão. Um dos integrantes do grupo seria Leonardo Gouvea da Silva, o Mad, acusado de ser matador de aluguel. Também alvo da Operação Submersus, ele está foragido.

No dia seguinte, segundo a DHC e o Gaeco, foi a vez de Bruno e Márcio Gordo irem ao condomínio. Eles, de acordo coma investigação, conseguiram pegaras caixas, nas quais estariam guardadas armas e munição. “Seriam seis fuzis ”, disse o delegado Daniel Rosa.Djac aterias ido encarregado de fazer o armamento desaparecer, jogando-o a omar. Coma desculpa de que praticava pesca submarina, ele alugou um barco para ir até as Ilhas Tijucas. Policiais contaram que o fundo de umadas caixas arrebentou, e odo noda embarcação percebeu, então, que havia armas dentro dela.

Suspeito com medo

Interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça comprovam, na opinião de investigadores, que Márcio Gordo e Djaca participaram de um esquema para fazer o armamento desaparecer. E, numa conversa por telefone com a namorada, Djaca justificou o que fez e revelou ter medo de ser assassinado:

“Como é que foi parar o seu nome nessa história?”, perguntou a namorada. Ao que Djaca respondeu: “Ronnie é meu pai, cara. Eu acho que alguém vai tentar me matar, irmão. O que eu fiz foi carregar umas caixas falando que era mudança, mais nada”.

No dia 14 de março deste ano, às 14h02m, quando, segundo a DHC e o Gaeco, as caixas com pelo menos seis fuzis já haviam sido jogadas ao mar, Márcio Gordo e Djaca se falaram. Márcio perguntou se ele tinha doado “os móveis”, e Djaca afirmou que sim. Uma semana depois, Djaca foi chamado para depor na DHC. Ele disse que trabalhava como porteiro e que, após a prisão de Lessa, recebeu uma ligação de Márcio, que lhe pediu para ir com urgência à “padaria do pomar”. No local, também teria encontrado o irmão de Elaine, Bruno Figueiredo.

Djaca contou também que Márcio e Bruno lhe perguntaram se tinha um caminhão para fazer uma mudança, pois queriam se livrar de “umas caixas de papelão com roupas velhas e papéis”. De acordo com o depoimento, os dois o recomendaram que jogasse tudo no mar.

Em um outro grampo telefônico, a DHC e o Gaeco descobriram que Djaca foi orientado por Márcio antes de prestar depoimento. E, no dia 3 de julho deste ano, Djaca teria feito outra menção às armas numa conversa por telefone com um interlocutor não identificado: “Eu sei onde foi jogado, né, cara, eles estão procurando no lugar errado”. O comentário, afirmam investigadores, foi uma referência às buscas feitas pela Marinha na véspera, a pedido da Polícia Civil e do Ministério Público.