O Globo, n. 31470, 05/10/2019. País, p. 06

Denunciado e mantido

Thiago Herdy
Jailton de Carvalho
Gustavo Maia


O Ministério Público Eleitoral denunciou à Justiça o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, acusado de liderar esquema de candidaturas-laranjas para desviar recursos no PSL-MG. O porta-voz Rêgo Barros disse que o presidente Bolsonaro vai mantê-lo no cargo e “aguardar o desenrolar do processo”.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, foi denunciado à Justiça pelo Ministério Público Eleitoral de Minas Gerais (MPE-MG) sob a acusação de liderar um esquema de candidaturas de fachada para desvios de recursos no PSL de Minas Gerais. Caso a denúncia seja aceita, ele vai virar réu pelos crimes de falsidade ideológica eleitoral (pena prevista de até cinco anos de detenção), apropriação indébita de recurso eleitoral (dois a seis anos) e associação criminosa (um a três anos). A denúncia ocorreu um dia depois de a Polícia Federal (PF) fazer o indiciamento do ministro na conclusão das investigações sobre o caso.

Em nota, Álvaro Antônio disse confiar “na Justiça e na comprovação de sua inocência”. O ministro afirmou que a investigação “teve como base uma campanha difamatória e mentirosa” e negou ter cometido “qualquer irregularidade na campanha eleitoral de 2018”. Por meio do porta-voz Rêgo Barros, o presidente Jair Bolsonaro informou que decidiu “aguardar o desenrolar do processo” e que vai mantê-lo no cargo. A declaração do porta-voz ocorreu após o indiciamento do ministro, e ainda antes da denúncia do MPE ser apresentada. À noite, ao chegar de volta ao Palácio do Alvorada, o presidente não quis falar do assunto. Questionado por repórteres, ele repetiu três vezes a expressão “sem comentários” ao ouvir perguntas sobre a permanência do ministro no posto. —Não tem coisas boas para perguntar para mim? Ralo o dia todo, e não tem uma coisa para perguntar? — questionou o presidente. Depois de conversar com simpatizantes que o aguardavam no local, Bolsonaro retornou à área onde estava a imprensa. —Pessoal, me desculpa aí, eu estou com a cabeça quente — disse, sem explicar o que lhe irritou.

O Globo apurou que Bolsonaro tem uma avaliação positiva do trabalho de Álvaro Antônio no ministério e considera que o caso faz parte do passado dele, sem conexão direta com o atual governo.

O esquema

Junto de Marcelo Álvaro Antônio, foram denunciadas mais dez pessoas, entre ex-candidatos, assessores do PSL e familiares de ex-assessores do partido. Segundo as investigações, o grupo do ministro, que controlava o PSL de Minas, inscreveu várias candidaturas femininas de fachada para os cargos de deputado federal e estadual no ano passado para cumprir a cota prevista em lei. Ao receber repasses dos recursos eleitorais do partido para a campanha, as candidatas eram pressionadas a devolver parte do dinheiro com a contratação de empresas e fornecedores ligados ao grupo. As denúncias partiram inclusive de candidatas do PSL.

O promotor Fernando Abreu, responsável pela denúncia, afirma que o ministro comandava o esquema: —Segundo a prova dos autos, o denunciado Marcelo era a cabeça principal dessa associação que foi montada para praticar a fraude na utilização dos recursos do fundo partidário eleitoral. Abreu lembrou que, além de presidente do partido, Álvaro Antônio era “detentor da liderança de fato do próprio partido, uma vez que a composição da estrutura da diretoria era toda ela ligada ao seu gabinete enquanto deputado federal”. — Todas as informações da campanha eram passadas diretamente de seus assessores para ele, para que se pudesse desenvolver toda a estrutura dos crimes que foram praticados — completou o promotor. Parlamentares do PSL tiveram reações diversas à denúncia contra o ministro. A senadora Soraya Thronicke defendeu Álvaro Antônio: — Todos são inocentes até o trânsito em julgado da sentença. Ele tem condições, sim, de tocar (o ministério), é um excelente gestor. E vai ter direito ao contraditório, à ampla defesa e eu acredito que tudo vai finalizar bem. Já o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), disse que, no lugar do ministro, se afastaria do cargo: — Eu, particularmente, no lugar do Marcelo Álvaro, eu pediria para sair do ministério para me defender e retornaria à Câmara, onde tem mandato para se defender, e usar o microfone para defender o governo. Além de Álvaro Antônio, foram denunciados Mateus Von Rondon, assessor especial do ministro; Irineu Inacio da Silva, deputado estadual em Minas pelo PSL; Lian Bernardino, Debora Gomes, Camila Fernandes e Naftali Tamar, as quatro suspeitas de ser candidataslaranja; Marcelo Raid Soares; Roberto Silva Soares, assessor do ministro; Reginaldo Donizeti Soares, irmão de Roberto e sócio de duas empresas que prestaram serviço eleitorais às candidatas investigadas, e Haissander de Paula, ex-assessor do ministro. As defesas dos demais denunciados não foram encontradas ou não se pronunciaram.

“Marcelo era a cabeça principal dessa associação que foi montada para praticar a fraude na utilização dos recursos do fundo partidário eleitoral.”

Fernando Abreu, promotor do MP eleitoral de Minas Gerais