O Estado de S. Paulo, n. 46872, 15/02/2022. Economia & Negócios, p. B4

Bolsonaro cria programa para incentivar ‘garimpo artesanal’

André Borges


 

Em uma ação direta de apoio a garimpeiros, o governo do presidente Jair Bolsonaro editou decreto que cria o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala, o Pró-mape. Trata-se, na prática, de uma ação para apoiar a lavra garimpeira, principalmente na região amazônica, onde a extração de ouro e pedras preciosas é majoritariamente ilegal.

Conforme informações da edição de ontem do Diário Oficial da União, o decreto assinado por Bolsonaro tem o objetivo de estimular o "desenvolvimento sustentável regional e nacional". Paralelamente, foi criada a Comissão Interministerial para o Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala (Comape), que definirá a atuação dos órgãos da administração pública federal para executar o programa.

O grupo será composto por membros do Ministério de Minas e Energia, que o coordenará, e da Casa Civil da Presidência da República, além dos ministérios da Cidadania, da Justiça, do Meio Ambiente e da Saúde. Pelo decreto, poderão ser convidados representantes de entidades públicas ou de outras instituições para participar das reuniões, mas sem direito a voto. O decreto estabelece ainda que a Amazônia Legal será a "região prioritária para o desenvolvimento dos trabalhos" da comissão.

Crítica a fiscais. Com frequência, Bolsonaro defende a atuação de garimpeiros e critica o trabalho de fiscais ambientais, quando há apreensão e destruição de máquinas utilizadas por atividades criminosas.

"Não é justo, hoje, querer criminalizar o garimpeiro no Brasil. Não é porque meu pai garimpou por um tempo. Nada a ver. Mas, no Brasil, é muito bacana o pessoal de paletó e gravata dar palpite em tudo que acontece no campo", disse Bolsonaro, em maio do ano passado, em conversa com apoiadores no Palácio da Alvorada.

Há garimpeiros que atuam legalmente no Brasil, por meio de cooperativas. Essa atuação, porém, é ínfima. No Congresso, o governo pressiona por mudanças na Constituição para que o garimpo seja autorizado em terras indígenas e unidades de conservação ambiental.

Dados do governo mostram que a eventual liberação da mineração, somente na área da Amazônia Legal, atingiria diretamente 40% da região, onde estão as florestas de proteção integral e as terras indígenas. A Amazônia Legal abrange nove Estados: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, além de parte do Maranhão.

A atual restrição legal não inibe empresas de registrar oficialmente suas áreas de interesse. Até o ano passado, segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), existiam cerca de 3,2 mil processos ativos de atividades minerais previstas dentro das terras indígenas da Amazônia Legal. Esses pedidos envolviam uma área total de 24 milhões de hectares, o equivalente a 21% de todo o território indígena.

Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, disse que Bolsonaro deixou claro que incentivaria o garimpo na Amazônia em sua campanha eleitoral, em 2018. "Deveriam se propor a resolver os problemas socioambientais graves que a explosão do garimpo, nos últimos três anos, está gerando, mas seria esperar demais do governo Bolsonaro", criticou. "A incompetência gerencial que marca esse governo deve transformar o decreto em letra morta. É o melhor destino para esse decreto." 

Sob suspeitas

229 toneladas

de ouro comercializadas pelo Brasil, entre 2015 e 2020, têm indícios de irregularidade, segundo estudo do Instituto Escolhas. Isso representa quase a metade da produção nacional

5 empresas

do setor financeiro foram responsáveis por quase um terço desse montante