O Globo, n. 31542, 16/12/2019. País, p. 6

Nos estados, 26 partidos sem prestação de contas

Ilvia Amorim
Sérgio Roxo


Enquanto líderes partidários se mobilizam para votar no Congresso, esta semana, a proposta de aumento do fundo eleitoral para 2020, nos estados a conduta de uma ampla maioria dos partidos expõe a falta de compromisso com dinheiro público e prestação de contas. Das 33 siglas em funcionamento no país, 26 tiveram diretórios estaduais impedidos de receber recursos do fundo partidário este ano por não honrar com a obrigação legal de apresentar sua contabilidade completa anualmente à Justiça Eleitoral. Há casos como o do PRTB, partido do vice-presidente da República, Hamilton Mourão, cuja omissão se arrasta por uma década.

Nas próximas eleições municipais, são essas instâncias partidárias que vão administrar parte dos recursos públicos que serão injetados no pleito. Pela primeira vez, candidatos a prefeito e vereador vão ter à disposição o fundo eleitoral para custear as campanhas.

Nanicos são maioria

O GLOBO levantou nos Tribunais Regionais Eleitorais dos estados com mais eleitores — SP, MG, RJ, BA, RS, PR, PE, CE, SC e GO — a lista de partidos, na esfera estadual, que foram punidos em 2019 por não prestação de contas. A Lei dos Partidos Políticos determina que toda legenda apresente anualmente, em abril, a contabilidadede receitas e despesas. Mesmo que não tenha recebido cotas do fundo partidário, a prestação de contas é exigida porque, pelo princípio da transparência, as siglas precisam informar por quem estão sendo sustentadas. Os tribunais podem considerar como contas não apresentadas as prestações incompletas dos partidos.

O grupo dos partidos que deixaram de prestar contas é dominado por nanicos, como o PSTU e o Democracia Cristã. Porém, siglas grandes também integram a lista. O DEM, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, está com acesso ao fundo partidário barrado no Rio. Também deixaram de prestar conta em, pelo menos um estado, PDT, PSB, Solidariedade e Cidadania.

O PSL, legenda que elegeu o presidente Jair Bolsonaro no ano passado, foi punido por não prestar contas em São Paulo, Bahia, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O Podemos, segundo maior partido do Senado, está na mesma situação em Minas, Goiás, Rio, Santa Catarina e São Paulo.

Uma situação mais complicada vive o PRTB. Além de não ter prestado contas em oito dos dez estados pesquisados, no Rio Grande do Sul, a legenda está com o acesso ao fundo partidário suspenso por não apresentar a sua contabilidade desde 2006.

Falta de estrutura, desorganização e desinteresse são os motivos apontados por advogados e analistas de contas partidárias como os principais motivos para um índice tão alto de omissão. Eles explicam que em nível municipal o problema se repete.

— Para apresentação das contas é necessário haver contador e advogado, e os representantes dos partidos não querem gastar seus recursos contratando esses profissionais. A rotatividade nas direções também acaba gerando omissões pois as informações dos exercícios financeiros acabam se perdendo — disse a analista e palestrante de cursos sobre prestação de contas Rita Gonçalves.

Advogada eleitoral, Angela Cignachi explica que a situação só não se repete na mesma proporção nos diretórios nacionais porque o volume de recursos do fundo partidário é maior nessa instância do que a cota que chega nos estados.

— O diretório nacional raramente tem controle de como está a prestação de contas nas demais instâncias partidárias. Como não é obrigatório o repasse de fundo partidário pelas direções nacionais ao partido nos estados e municípios, muitos diretórios regionais nem recebem nada e, por isso, não prestam contas — disse Angela.

Legislação

A direção nacional do Podemos informou que está trabalhando “no apoio para que os diretórios estaduais regularizem suas prestações de contas”. A direção do DEM no Rio informou que obteve uma decisão no último dia 10 que regularizou a sua prestação de contas. As direções nacionais do PSL e do PRTB não responderam. O diretório gaúcho do PRTB, que está há mais de uma década sem prestar contas, não foi localizado porque está sem um responsável, no momento.

A legislação atual estabelece que partidos punidos com a suspensão de fundo partidário tenham interrompida a sanção em anos de eleição, durante o segundo semestre. No mesmo sentido, não há qualquer impedimento legal para que essas legendas recebam dinheiro do fundo eleitoral.

Nas eleições de 2018, o fundo eleitoral foi orçado em R$ 1,7 bilhão. Neste ano, a proposta do governo foi reajustá-lo para R$ 2 bilhões. Uma articulação dos partidos no Congresso fez o montante crescer para R$ 3,8 bilhões, mas líderes partidários negociam a redução do valor para R$ 2,5 bilhões. O presidente Jair Bolsonaro já sinalizou que vetará qualquer valor acima do proposto pelo Planalto.

“É necessário haver contador e advogado, e os representantes dos partidos não querem gastar seus recursos contratando esses profissionais. A rotatividade nas direções também acaba gerando omissões” — Rita Gonçalves, analista e palestrante de cursos sobre prestação de contas.