Título: Carisma
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 08/04/2005, Internacional, p. A8

Funeral de João Paulo II reúne o maior grupo de líderes mundiais já visto

VATICANO - Só o carisma de João Paulo II poderia fazer Roma reassumir a antiga glória e se transformar, hoje, de novo, na capital da civilização. O funeral do papa trouxe à cidade 200 chefes de Estado e de governo, líderes políticos e religiosos de todas as crenças. A cerimônia, tal é a magnitude, pode se tornar o evento mais importante da História unindo autoridades e cidadãos comuns. Fora da basílica, as praças de Roma estarão ocupadas por centenas de milhares de moradores ou peregrinos de todos os continentes, numa manifestação em massa de solidariedade por Karol Wojtyla.

A maior parte das delegações estrangeiras chegou ontem à cidade, cujo espaço aéreo foi fechado para aeronaves comuns desde cedo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou ao lado dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e José Sarney. Um terceiro ex-presidente, Itamar Franco, recepcionou o grupo na embaixada do Brasil. Durante o vôo para a Itália, quando o Airbus pousou para reabastecer em Recife, o presidente respondeu às declarações do cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, d. Eusébio Scheid, que o definiu como ¿caótico, e não católico¿.

¿ Crer em Deus é uma relação pessoal, não precisa se tornar pública. Todos sabem que sou homem de muita fé. Estamos indo ver o enterro de alguém que simbolizou a paz nos últimos 26 anos para que o mundo fosse melhor ¿ afirmou Lula, que disse já ter freqüentado mais as igrejas do que hoje.

¿ Quando vou, comungo, não tem problema. Fui coroinha quando jovem e não preciso provar a cada dia que sou católico ou que creio em Deus.

O presidente Lula também participou de um culto ecumênico durante o vôo. A cerimônia, comandada pelo arcebispo de Brasília, dom João Bráz de Avis, durou 20 minutos na cabine presidencial. Avis lembrou o caráter ¿inédito¿ da comitiva e disse que ¿o culto propiciaria um momento de oração comum e uma unidade de entendimento de pessoas de credos diferentes¿, em alusão à presença do secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, dom Odilon Scherer, do pastor luterano Rolf Schunemann, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, do xeque Armando Hussein, da Federação Islâmica do Brasil e do rabino Henry Sobel, da Congregação Israelita Paulista.

¿ João Paulo foi um amplificador e congregador, um homem de coração enorme, no qual cabiam todos os filhos de Deus. Ele soube, como ninguém, aproximar povos de todos os credos ¿ disse Sobel.

Seguiram na comitiva os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), e do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, além da primeira-dama Marisa Letícia e do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.

Para o presidente ucraniano Viktor Yushchenko, Karol Wojtyla foi uma figura ¿planetária, que entrou na coração de milhões de pessoas¿. O presidente do parlamento de Cuba, Ricardo Alarcón, afirmou que a morte do papa causou grande impacto no país, enquanto o presidente eslovaco, Ivan Gasparovic, assegurava que o pontificado ¿foi baseado no amor e na defesa da liberdade¿.

¿ O muro de Berlim não caiu em 1989 pelas armas, mas pela força do espírito ¿ lembrou.

O funeral terá, ainda, o efeito de reunir inimigos como os presidentes dos EUA, George Bush e do Irã, Mohammad Khatami, que, segundo o primeiro, integra o chamado ¿Eixo do Mal¿. Por pelo menos três horas os dois estarão separados apenas por algumas cadeiras.