O Estado de S. Paulo, n. 46874, 17/02/2022. Internacional, p. A14

Bolsonaro diz a Putin ser solidário à Rússia e sugere parceria em energia

Eduardo  Gayer


 

Após reunião de duas horas realizada em meio à crise na Ucrânia, Jair Bolsonaro disse que sugeriu ao presidente russo, Vladimir Putin, cooperação nas áreas de energia e agricultura. O brasileiro também se disse solidário à Rússia e "aos países que se empenham pela paz".

Diferentemente de outros chefes de governo que visitaram Putin recentemente, Bolsonaro foi recebido com um aperto de mão e sentou-se ao lado do russo. O francês, Emmanuel Macron, na semana passada, e o alemão, Olaf Scholz, na terça-feira, se reuniram com Putin em lados opostos de um mesão de seis metros de comprimento.

A diferença é que Macron e Scholz se recusaram a fazer o teste PCR russo, por temores de que a Rússia pudesse se apossar do DNA dos dois. Já Bolsonaro foi submetido a cinco exames, o último deles na manhã de ontem.

Ucrânia. Bolsonaro foi à reunião acompanhado apenas de um intérprete. Nem mesmo o chanceler Carlos França participou. No final, o presidente brasileiro disse que não tratou diretamente com Putin sobre a Ucrânia – como havia recomendado o Itamaraty. No trecho do encontro que foi aberto à imprensa, Bolsonaro disse que era "solidário à Rússia", sem especificar a que se referia.

Mais tarde, ele tentou esclareceu a declaração. "Falei para ele que o Brasil apoia qualquer outro país e é solidário, desde que busquem a paz. E essa é a intenção dele (Putin). Não entramos em questões regionais, mas a posição do Brasil é essa", declarou Bolsonaro. "Putin é uma pessoa que busca a paz. Qualquer conflito não interessa a ninguém no mundo."

Na reunião, Bolsonaro mencionou também parcerias no setor de gás e petróleo, além do interesse em pequenos reatores nucleares modulares. Ele agradeceu a Putin pelo envio de fertilizantes, essencial para as lavouras brasileiras – o comunicado do Itamaraty publicado ontem, porém, não menciona a assinatura de nenhum acordo sobre o insumo.

Pacifista. Após deixar o Kremlin, Bolsonaro levantou uma falsa relação entre sua viagem à Rússia e a suposta retirada de forças russas da fronteira da Ucrânia. O anúncio do recuo, que ainda não foi corroborado pela Otan, ocorreu antes da chegada do presidente a Moscou, mas seus partidários divulgaram que haveria uma correlação entre os fatos.

"Mantivemos nossa agenda e, por coincidência ou não, parte das tropas deixaram as fronteiras. Entendo que tudo indica uma grande sinalização de que um caminho para a solução pacífica se apresenta no momento para Rússia e Ucrânia", disse a jornalistas depois de jantar com empresários.

Em Washington, o governo americano mostrou que estava atento ao que acontecia no Kremlin. Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, disse esperar que o presidente brasileiro tenha reforçado os valores ocidentais durante a reunião com Putin.

"Esperamos que Bolsonaro tenha aproveitado o encontro com para reforçar as mensagens que estão consagradas nos valores que partilhamos e são parte integrante da ordem internacional com base em regras", afirmou. Price foi questionado sobre as consequências para a relação Brasil-eua, caso Bolsonaro não tenha compartilhado com Putin a mensagem, mas ele não respondeu. / Colaborou Beatriz Bulla

"Coincidência ou não, parte das tropas deixaram (sic) a fronteira"

Jair Bolsonaro

Presidente do Brasil, ao sugerir que sua visita teve influência na decisão de Putin de retirar parte das tropas