O Globo, n. 31474, 09/10/2019. País, p. 12

Líder do PP na Câmara vira réu por corrupção passiva no Supremo

Leandro Prazeres


A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem aceitar parcialmente uma denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o líder do PP na Câmara dos Deputados, Arthur Lira (AL). O parlamentar virou réu pelo crime de corrupção passiva — os ministros rejeitaram parte da denúncia que também indicava o crime de lavagem de dinheiro. Lira já responde a outro inquérito na Corte, por organização criminosa.

Dos cinco integrantes da turma, apenas três estavam presentes durante a sessão em que a denúncia foi avaliada. Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, e Alexandre de Moraes votaram juntos pelo recebimento parcial do caso. Os outros dois ministros da turma, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, não participaram.

De acordo com a PGR, Lira teria aceitado, em 2012, dinheiro de propina paga pelo então presidente Companhia Brasileira de Transportes Urbanos (CBTU), Francisco Colombo. Os pagamentos teriam sido feitos para que Lira apoiasse a permanência de Colombo no cargo. O valor do pagamento, diz a acusação, foi de R$ 106 mil. Há a suspeita de que esse dinheiro pago por Colombo foi apreendido pela Polícia Federal (PF) no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em 2012.

A apreensão ocorreu no momento em que o então assessor de Lira Jaymerson José Gomes tentava embarcar em um voo. A polícia desconfiou de Gomes e constatou que ele carregava R$ 106 mil presos ao corpo, inclusive dentro das meias.

“Francisco Colombo, para se manter na presidência da CBTU, oferecia e pagava vantagens indevidas a Arthur Cesar Pereira de Lira para que este, na condição de deputado federal, líder do PP na Câmara dos Deputados, com a prerrogativa de fazer indicações para cargos em comissão, mantivesse-o naquele cargo como nomeação política da agremiação”, afirmou na denúncia a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Além dos dados da apreensão, a denúncia de Dodge contém informações da colaboração premiada do doleiro Alberto Youssef.

Viagem financiada

O advogado de Lira, Pierpaolo Bottini, defendeu no Supremo que não há indícios de que o dinheiro apreendido com Gomes fosse resultado de pagamento de propina e nem de que o parlamentar tivesse conhecimento de que o então assessor estivesse viajando para transportar o valor.

Bottini disse que, apesar de a passagem de Gomes ter sido comprado através do cartão de crédito de Lira, o deputado não sabia da viagem. Ao tomar conhecimento do caso, afirmou o advogado, Lira teria demitido o assessor.

O ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, o STF defendeu que o STF aceitasse apenas a denúncia de corrupção passiva contra Lira porque o fato de o assessor dele ter ocultado dinheiro não representou uma tentativa de dar aspecto lícito ao valor, como ocorre no crime de lavagem de dinheiro.

— A conduta de esconder as notas pelo corpo sob as vestes nos bolsos do paletó junto à cintura e dentro das meias não se reveste da indispensável autonomia em relação ao crime antecedente. Essa ocultação em si não deu ao dinheiro aspecto de dinheiro lícito — afirmou o magistrado.

O ministro Alexandre de Moraes, que acompanhou o relator junto com Rosa Weber, apontou que há incompatibilidade entre as versões apresentadas pela defesa de Lira. De acordo com Moraes, além da tentativa de negar do caso, houve indicação de que Gomes teria transportado os R$ 106 mil para adquirir um automóvel.

— Há uma mudança de versões da defesa, ora quase uma negativa geral, e depois que esse assessor teria vindo com dinheiro para comprar um carro em São Paulo — declarou o ministro.

Após a Primeira Turma decidir aceitar parte da denúncia, a defesa de Lira informou que “respeita a decisão”, mas “lamenta pela falta de coerência da denúncia”. O argumento é que “a PGR acusa o ex-presidente da CBTU de pagar o deputado para permanecer no cargo” enquanto “tal cargo tem mandato fixo de três anos, de forma que não havia necessidade ou razão para pagamentos”. Para os advogados de Lira, “não existiu participação ou ciência do parlamentar sobre o episódio”.

Lira já é réu em outro processo, que teve a denúncia recebida pela Segunda Turma do STF em junho. Ele, os deputados Eduardo da Fonte (PP-PE) e Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI), presidente da legenda, respondem à acusação de integrar uma organização criminosa, no caso conhecido como “quadrilhão do PP”. (Com informações do G1).