Título: Protesto contra o governo pára Quito
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Fonte: Jornal do Brasil, 14/04/2005, Internacional, p. A8

Gutiérrez e oposição negociam impasse estabelecido em dezembro, com dissolução da Suprema Corte

QUITO - Manifestantes bloquearam ruas com pneus em chamas e paralisaram ontem os transportes de Quito, depois que o governo e o Congresso fracassaram em mais uma tentativa de acordo sobre o controle do Judiciário.

Gritando palavras de ordem contra o presidente Lucio Gutiérrez, funcionários públicos municipais em greve pararam as ruas da capital equatoriana desde o começo da manhã. Escolas e repartições municipais também foram fechadas. O prefeito de Quito, Paco Moncayo, do Partido da Esquerda Democrática (oposição), autorizou a greve.

Na terça-feira, o Congresso equatoriano rejeitou uma proposta do governo para encerrar o impasse político aberto em dezembro, quando uma maioria temporária no Parlamento substituiu todos os juízes da Suprema Corte.

Mesmo assim, o ministro do Interior, Oscar Ayerve, está otimista e afirmou que um acordo pode estar próximo. O Congresso volta a negociar hoje a questão.

A crise inquieta os investidores e desperta as lembranças da turbulência que levou à queda de presidentes eleitos em 1997 e 2000. Os Estados Unidos e a ONU se dizem preocupados com a suposta interferência do governo no Judiciário.

O impasse adia a votação de projetos econômicos no Congresso e, por isso, Gutiérrez ofereceu demitir a atual Suprema Corte e criar um mecanismo mais independente para nomear os novos juízes.

Policiais e militares vigiavam o palácio presidencial e as ruas vizinhas, enquanto os manifestantes gritavam: ''Lucio fora! Democracia, sim! Ditadura, não!''. Políticos da oposição acusam Gutiérrez de buscar poderes excessivos e de usar o novo tribunal para arquivar denúncias de corrupção existentes contra seu aliado Abdalá Bucaram, que voltou do exílio no Panamá neste mês.

Segundo os críticos, agora que Bucaram está a salvo e em seu reduto de influência - Guayaquil -, o governo está disposto a ceder o controle sobre os tribunais. Bucaram e seu partido apoiaram Gutiérrez em uma tentativa de impeachment contra o presidente em 2004.

O ministro do Interior disse que a nova Suprema Corte é menos tendenciosa que a anterior, a qual, segundo o governo, era dominada pela oposição.

- A nova corte é fruto de acordos políticos e também tem conexões políticas, embora menos que no passado - disse o ministro na terça-feira.

A situação de Gutiérrez melhorou na semana passada, quando as Forças Armadas, que tradicionalmente agem como árbitro em questões políticas no Equador, declararam apoio ao presidente, que é coronel aposentado. O partido da Sociedade Patriota (situação) tem apenas cinco deputados e, por isso, depende de frágeis alianças para governar.

Além dos militares, o presidente tem a seu favor também a divisão da oposição e o interesse dos Estados Unidos em manter a estabilidade no país, que exporta petróleo e faz fronteira com a Colômbia.

A greve contra o governo de Gutiérrez começou na madrugada de ontem.

- A paralisação cívica se prolongará durante 24 horas - disse Blasco Peñaherrera, presidente da Câmara de Comércio de Quito, um dos promotores do protesto.

Peñaherrera explicou que a medida procurava afetar principalmente as províncias de Pichincha - cuja capital é Quito - e Azuay, ao Sul, que tem como capital Cuenca.

A polícia informou que as estradas nessas duas províncias foram bloqueadas. Em Quito, 1.000 indígenas tomaram as principais ruas.