O Globo, n. 31540, 14/12/2019. Rio, p. 21

Justiça manda criar gabinete de crise na Saúde do município

Luiz Ernesto Magalhães


A Justiça mandou a prefeitura instala rum gabinete de crise para a Saúde que deve funcionar, no mínimo, até março de 2020. A decisão é do desembargador Cezar Augusto Rodrigues Costa, da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio. Ela atende a uma ação civil do Ministério Público estadual e da Defensoria, que consideram a medida fundamental para evitar o colapso da rede municipal. Procurada, a prefeitura não comentou a ordem judicial. O gabinete deve ter a participação das Organizações Sociais( OSs),quec obram repasses do município, e de órgãos da prefeitura como RioUrbe, RioSaúde — que administra hospitais — e Comlurb. Também atuarão as secretarias de Saúde e de Fazenda. "A atuação do Judiciário não pode ser tida como intervencionista, mas necessária e devida", justificou o desembargador. O arresto ontem nas contas da prefeitura para o pagamentodos funcionários de OSs que estão com os salários de outubro e novembro atrasados não foi suficiente para solucionar o problema. Os oficiais de Justiça que estiveram no Banco do Brasil só encontraram R$ 67 milhões, 26% do valor devido aos terceirizados. A informação é do advogado José Carlos Nunes, que representa os sindicatos dos auxiliares e técnicos de enfermagem e dos agentes comunitários. O confisco determinado pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RJ) foi de R$ 256 milhões, total que quitaria as folhas dos dois meses e também o 13º. Para conseguir os R$ 189 milhões restantes, outros valores em contas da Caixa devem ser arrestados semana que vem.

O dinheiro obtido ontem não deve estar nas contas dos funcionários antes de terçafeira porque o TRT-RJ só vai repassar averba para as OSs depois do fim de semana. Ao mesmo tempo, os sindicatos já se movimentam para pedir outro bloqueio e garantir os salários de dezembro. Nessa batalha por recursos, a prefeitura assinou ontem um termo de ajuda federal para receber do Ministério da Saúde R$ 152 milhões. O acordo prevê que o Rio desista do processo judicial contra a União em que pede a devolução de 24 unidades de Saúde municipalizadas entre 1994 e 2000. A previsão é que R$ 76 milhões entrem no caixa do município na próxima quinta-feira. O restante só sai em janeiro. Em outra briga na Justiça, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Alexandre Agra Belmont, autorizou a prefeitura a sacar recursos de contas vinculadas (com repasses da União). — A prefeitura alega que parte dessa verba, que está bloqueada,éder e passes da União para a Olimpíada. Essas contas têm R $355 milhões, mas caberá ao TRT avaliar aquantia que pode, de fato, ser liberada — disse o ministro do TST.

Entidades reagem após prefeitura barrar Grupo Globo

Equipes de reportagem do Grupo Globo foram impedidas, na manhã de ontem, de participar de uma coletiva com autoridades no Palácio da Cidade, sede da prefeitura do Rio, em Botafogo. O evento era com o ministro em exercício da Saúde, João Gabbardo, que assinou um repasse de recursos federais para o município, e com o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, que liberou verba para obras no Sambódromo. Na entrada, no entanto, a jornalista Valéria Blanc, assessora de imprensa da prefeitura, informou que os veículos O GLOBO, Extra, TV Globo, Globo News, G1 e CBN não tinham sido convidados para a agenda pública.

Entidades criticam

Apesar do veto, os veículos do grupo mantêm o compromisso de dar todas as informações à população no que se refere à crise na Saúde e ao resultado do acordo que vai liberar R$ 152 milhões da União para a rede municipal de Saúde. Entidades criticaram a atitude do município. Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) defendeu os compromissos da entidade com a liberdade de imprensa e a democracia e afirmou que o prefeito Marcelo Crivella "mostra não ter a dimensão de seu cargo".

Para a Associação Nacional de Jornais (ANJ), além de desrespeito com a imprensa, houve uma "afronta" ao cidadão carioca. "Essa discriminação é absurda e inadmissível", ressaltou a entidade. "A prefeitura do Rio não pertence a este ou àquele prefeito. O que está ocorrendo é uma afronta ao cidadão e ao contribuinte cariocas, prejudicados no seu direito de amplo acesso às informações", disse o texto. Já a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) afirmou que a atitude da prefeitura viola a Constituição Federal. Segundo a entidade, "Crivella atropela deliberada e reiteradamente os princípios da democracia e do Estado de Direito". A associação destacou ainda, em seu site, que "o prefeito precisa agir de acordo com as regras sob as quais tomou posse e a favor dos cidadãos aos quais serve".