O Globo, n. 31476, 11/10/2019. País, p. 04

O revide de Bivar

Bruno Góes
Marco Grillo
Natália Portinari
Naira Trindade


O estopim que levou o presidente Jair Bolsonaro a fazer uma crítica pública ao PSL esta semana e a avaliar deixar o partido foi uma mudança no estatuto da sigla que aumentará, na sua avaliação, a concentração de poder nas mãos do presidente da legenda, Luciano Bivar. Bolsonaro também está incomodado com a suposta falta de transparência na utilização dos recursos do fundo partidário. Bivar, por sua vez, reagiu afirmando que Bolsonaro está mal aconselhado (detalhes na entrevista abaixo). Em meio à disputa, o PSL já iniciou a “caça às bruxas” e puniu quatro deputados, que perderam cargos e postos na Câmara.

Estão na mira os 19 que assinaram uma carta em apoio ao presidente da República. Os deputados Carlos Jordy (RJ), Filipe Barros (PR), Alê Silva (MG) e Aline Sleutjes (PR) perderam suas vagas em comissões e cargos nas lideranças da Câmara. Filipe Barros, por exemplo, era vice-líder do PSL na Casa e titular na CPMI das Fake News. A ordem para punir os dissidentes partiu da Executiva Nacional após a divulgação da carta pró-Bolsonaro.

— Essa perseguição não deveria ocorrer porque apenas nos manifestamos no sentido de transparência do partido. A transparência no sentido das contas e em todos esses casos, que acabam indo para a mídia, e causam desconforto para parlamentares que não têm nada a ver com isso. O próprio estatuto (alterado por Bivar) — diz Jordy.

— Ele fez isso sem dialogar com ninguém, é totalmente ilegal e ilegítimo.

Aprovada no mês passado, a mudança no estatuto do PSL criou mais 52 vagas de titulares e 18 de suplentes em seu diretório nacional. Os atuais suplentes serão automaticamente transformados em titulares em função da criação das novas vagas. Com isso, a avaliação do grupo de Bolsonaro é que Bivar terá ainda mais controle sobre os rumos do partido. E que não haverá espaço para Bolsonaro influenciar no processo eleitoral do ano que vem.

Essas alterações foram apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em janeiro, aprovadas no dia 5 do mês passado pela Justiça Eleitoral, e tornadas públicas apenas na última segunda-feira no Diário Oficial do TSE. Segundo deputados do PSL, Bolsonaro ficou revoltado.

Deputados alinhados a Bolsonaro também reclamam que a direção do PSL não presta contas sobre os R$ 8 milhões mensais que o partido recebe do fundo partidário.

Aliados de Bolsonaro dizem suspeitar que os recursos estejam sendo usados para outros fins e, por isso, Bivar não esteja fazendo repasses aos diretórios estaduais. Fontes do Palácio do Planalto ouvidas pelo GLOBO dizem que Bolsonaro teria sido alertado das supostas irregularidades, o que motivou a declaração do presidente a um apoiador, na porta do Palácio da Alvorada, para “esquecer” o PSL e que Bivar está “queimado”.

As brigas teriam começado com a cobrança do grupo de Bolsonaro para a contratação de uma empresa de compliance para dar mais transparência ao partido.

— Não existe nada contra Bivar, mas quem quer que esteja na direção nacional do partido precisa trabalhar com transparência. A gente precisa trabalhar o estatuto, fazer auditoria e compliance e ele não quer fazer —disse a deputada Carla Zambelli (PSL-SP).

Já o líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), acusa os advogados Karina Kufa e Admar Gonzaga, exministro do TSE —conselheiros de Bolsonaro — de quererem assinar contratos milionários com prestadores de serviços:

— O partido não vai se submeter a esses achacadores. Eles querem controle total dos recursos, mas esses recursos são destinados a deputados federais.

Punições

Nesse contexto, poucos dos 53 deputados federais do PSL devem acompanhar Bolsonaro, caso ele decida realmente abandonar a sigla. Isso porque Bivar alocou aliados no comando de diretórios estaduais e já prometeu aos parlamentares candidaturas nas principais prefeituras do país.

É oca sode Nelson Barbudo( MT ), cota dopara concorrerem Cuiabá, Delegado Pablo (AM), pré-candidato em Manaus, e Julian Lemos (PB ), em João Pessoa. Se optarem por não concorrer, devem influenciara escolha de aliados como candidatos. Em São Paulo, a candidata de Bivar é Joice Hasselmann, contrariando diretamente o desejo de Bolsonaro.

Esse cálculo também deve pesar entre deputados estaduais. Em Campinas( SP ), a deputada estadual Valéria Bolsonaro, parente distante do República, enfrenta a resistência do deputado federal Eduardo Bolsonaro, que tem demonstrado interesse em apoiar o vereador Tenente Santini (PSD). No Rio, Gil por exemplo, querde Campos e Alana Passos, ade Queimados. (Colaboraram Guilherme Caetano e Paulo Capelli)