O Globo, n. 31509, 13/11/2019. Opinião, p. 2

É relevante a promulgação da reforma


A promulgação da reforma da Previdência, pelos presidentes do Senado e da Câmara, Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia, transcende o fato em si, por não se tratar apenas de um evento do calendário político administrativo do Congresso. A solenidade realizada ontem formalizou uma das mais profundas mudanças já realizadas no sistema de seguridade, reforma vital para o sustento de milhões de famílias. Principalmente as mais pobres, a grande maioria delas.

Numa perspectiva mais ampla, esta reforma impedirá, por enquanto, a quebra fiscal do Estado, já sinalizada pelo crescimento da dívida pública de 50% do PIB, em 2010, para os quase 80% atuais.

O índice ainda continuará a subir, porque persiste o déficit nas contas públicas, impossibilitando que o Estado volte a investir em obras de infraestrutura que melhorem a qualidade de vida da grande maioria dos 210 milhões de brasileiros.

Como pedras de dominó, esta sucessão de problemas levou à retração dos investimentos privados, contidos pelo compreensível medo que tinham os agentes econômicos, internos e externos, de empatar capital em um país com perspectiva de cair num redemoinho de depressão e convulsões social e política.

Portanto, é histórico o trabalho que o Congresso, mesmo coma falta de empenho do presidente Bolsonaro, conseguiu executar, junto com equipes do Executivo, destacando-se as do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do secretário especial da Previdência, Rogério Marinho.

A situação-limite a que se chegou na Previdência se deve à classe política, costumeiramente sensível a pressões corporativistas que partem dos servidores públicos e de sindicatos em geral.

Iniciada a redemocratização em 1985, depois de 21 anos de ditadura, o debate na sociedade ganhou os espaços democráticos que se abriam e, na agenda econômica, entraria a questão da Previdência.

O PT e aliados da esquerda impediram que na gestão do tucano Fernando Henrique Cardoso (19942001) todas as alterações necessárias fossem executadas. Mas era tão imperiosa a reforma que mesmo o PT, ao chegar ao Planalto, com Lula e Dilma, foi levado a tocar esta agenda, apesar de todo o discurso contra. A aritmética é implacável, não tem ideologia. Porém não foi a fundo.

Mas agora houve, enfim, a consciência majoritária entre os políticos de que os pobres, que dizem proteger, são os primeiros e grandes prejudicados numa crise fiscal. E já estão sendo, nas emergências do SUS, na precariedade de escolas públicas etc.

Por suposto, as regras previdenciárias continuarão sendo atualizadas, porque o processo demográfico de envelhecimento da população exige. No Brasil, há também outro motivo: reduzir a injustiça social das gritantes desigualdades entre os benefícios do funcionalismo, privilegiado, e do aposentado da iniciativa privada (INSS). Esta reforma apenas começa a enfrentar a distorção.