O Globo, n. 31509, 13/11/2019. País, p. 6

Tropa aliada
Marco Grillo
Jussara Soares
Naira Trindade



Mais de um mês depois da guerra interna no PSL se tornar pública, o presidente Jair Bolsonaro anunciou ontem que deixará a legenda para formar uma nova sigla, batizada de “Aliança pelo Brasil”. O plano é criar o partido até março do ano que vem, a tempo de estrear nas eleições municipais. A coleta das mais de 490 mil assinaturas necessárias deve ser feita com o auxílio de um aplicativo, mas os próprios advogados e aliados do presidente admitem que questionamentos jurídicos podem atrapalhar os planos traçados por Bolsonaro. Cerca de 30 deputados devem acompanhá-lo na empreitada.

Há dúvidas se a inovação digital será aceita pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de que forma exatamente a tecnologia pode funcionar. O entorno do presidente, entretanto, afirma que ele já tem um plano B, caso a nova legenda não seja criada antes das eleições para prefeitos e vereadores. Bolsonaro, que como presidente da República pode ficar sem partido, planeja apoiar aliados de outras siglas desde que alinhados ao seu perfil ideológico.

Na reunião de ontem no Palácio do Planalto, em que anunciou sua saída do PSL a apoiadores do partido, Bolsonaro leu um manifesto apresentando o “Aliança pelo Brasil ”. O texto afirma que a legenda almeja “livrar o país dos larápios, dos espertos, dos demagogos e dos traidores que enganamos pobres e os ignorantes que eles mesmo mantêm, paras e fartar .” E coloca a nova sigla como uma aliança “com as pessoas de bem, com os trabalhadores, com os empresários, com os militares, com os religiosos e com todos aqueles que desejam um Brasil realmente grande, forte e soberano”, de acordo com a colunista Bela Megale.

O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) já entregou o pedido de desligamento ao TSE, segundo interlocutores. Por ter concorrido em uma eleição majoritária, Flávio, assim como o pai, não corre o risco de perder o mandato. Deputados que decidam deixar o PSL, porém, seriam enquadrados na regra de infidelidade partidária, podendo perder seus cargos. A próxima janela que permitiria a troca sem punição só será aberta em 2022. Os bolsonaristas, no entanto, apostam em uma mudança legislativa que abra essa possibilidade no ano que vem.

Até a expulsão do partido é vista como um bom caminho, uma vez que processos disciplinares foram abertos pela cúpula da legenda contra integrantes do grupo bolsonarista que se contrapôs à ala ligada ao presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE). No caso de expulsão, o PSL poderia requerer o mandato, mas os deputados argumentariam que sofreram “grave discriminação política e pessoal”, uma das possibilidades para trocar de legenda sem punição. A tendência, nesses casos, é que a Justiça Eleitoral seja acionada para definir se o parlamentar perde ou não o cargo.

— Para nós, que já decidimos migrar sem qualquer tipo de acordo, se o PSL conduzir rapidamente os processos e houver expulsão, na nossa perspectiva é melhor. Se isso não ocorrer, assim que for juridicamente possível, com o partido formalmente criado, vai se abrir a janela e nós vamos migrar — afirmou o Major Vitor Hugo (PSL-GO), líder do governo na Câmara.

Segundo participantes da reunião, Bolsonaro mais uma vez usou o casamento como metáfora e disse que não falaria mal da “ex-mulher”, referindo-se ao PSL, e pediu a todos que tivessem a mesma postura. Ele destacou que já estava decidido a fundar um partido e deixou os presentes à vontade para segui-lo ou não. O presidente é um dos cotados para assumir o comando da nova legenda, junto com seu filho, Flávio.

Segundo a deputada Carla Zambelli (PSL-SP), que esteve no encontro, o presidente deve usar suas redes sociais a fim de chamar as pessoas para se filiarem ao novo partido.

— A ideia é que o partido se mantenha na vaquinha, na venda de produtos, contribuições, enfim, um outro tipo de partido sem fundo eleitoral e sem fundo partidário — disse.