Título: Severino interfere em comissão do aborto
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Fonte: Jornal do Brasil, 09/04/2005, País, p. A6
Folhapress
BRASÍLIA - Depois de meses de polêmica e sem muito alarde, a comissão tripartite formada pelo governo federal para revisar a legislação punitiva do aborto foi oficializada com um revés: duas das deputadas indicadas pela bancada feminina foram preteridas por parlamentares escolhidas por Severino Cavalcanti (PP-PE), presidente da Câmara. Não está claro se houve viés ideológico, uma vez que Severino Cavalcanti, católico, é declaradamente contra a iniciativa. A queixa ocorreu porque havia um entendimento entre o presidente da Câmara e a ministra Nilcéia Freire (Secretaria de Políticas para Mulheres) de que seriam acatados os nomes da bancada, cuja tendência é pró- descriminação.
Ficaram de fora, no entanto, as deputadas Jandira Feghali (PC do B-RJ) e Dra. Clair (PT-PR). A correligionária de Severino, Suely Campos (PP-PR), permane-ceu. Entraram as deputadas Elaine Costa (PTB-RJ) e Angela Guadagnin (PT-SP) - esta última contra a descrimi-nação.
Começam na terça-feira que vem os trabalhos do grupo, composto por seis representantes do governo, seis do Legislativo e seis da sociedade civil. A posição do governo é flexibilizar de alguma forma o Código Penal, que pune com um a três anos de detenção a mulher que realiza um aborto.
Na prática, essa punição não é aplicada, mas a sanção faz com que, a cada ano, cerca de 1 milhão de mulheres realize abortos clandestinos, geralmente em condições inseguras, contribuindo para altos índices de mortalidade.
Dos seis representantes da sociedade civil, quatro vêm de entidades feministas e são a favor da descriminação.
Os outros dois integrantes, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia, deverão ter participação técnica (médica e ética).
Inicialmente, o governo quis incluir uma participação religiosa, mas o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) declinou o convite. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) protestou sobre a comissão e sua composição.
A comissão já foi empossada extra-oficialmente na última quarta, sem muita atenção da mídia. O grupo foi nomeado na edição de ontem do Diário Oficial da União e terá 60 dias, prorrogáveis, para apresentar um projeto de revisão legislativa.