O Estado de S. Paulo, n. 46917, 01/04/2022. Saúde, p. A19

'Vão parar de consumir ivermectina', diz autor de estudo sobre remédio

Ítalo Lo Re 


A ivermectina não se mostrou eficaz para evitar que pacientes com covid-19 fossem internados, de acordo com o resultado de um grande ensaio clínico publicado na quarta-feira. A pesquisa envolveu 1.358 pessoas infectadas pelo novo coronavírus de 12 cidades de Minas Gerais. Os resultados foram publicadas no The New England Journal of Medicine.

Pesquisadores realizaram um estudo duplo-cego, com pacientes que tiveram sintomas de covid-19 por até sete dias entre 23 de março de 2021 e 6 de agosto de 2021, principal pico de mortes da pandemia no Brasil. Metade foi aleatoriamente designada para ser medicada com ivermectina (679 pacientes) e outra metade recebeu placebo (679 pacientes).

"O resultado demonstrou que nós não tivemos nenhuma sinalização de benefício dessa medicação para tratar a covid", disse ao Estadão o pesquisador e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas (PUC-Minas) Gilmar Reis, que liderou o estudo.

Voluntários que tomaram ivermectina nos primeiros três dias após um teste positivo de coronavírus, inclusive, tiveram resultados piores do que os do grupo placebo. O estudo foi revisado por pares antes de ser publicado no periódico científico.

Segundo o pesquisador, a expectativa agora é de que os resultados obtidos pelo estudo levem a efeitos no tratamento da covid. "Com certeza, em diversas partes do mundo, vão parar de consumir ivermectina", aponta Reis.

Antiparasitário. A ivermectina normalmente é usada como medicamento antiparasitário e demonstrou ter eficácia clínica no tratamento contra oncocercose (infecção por verme), estrongiloidíase (infecção intestinal) e sarna. No início da pandemia, pesquisadores passaram a testar vários medicamentos contra o covid-19 e surgiu a hipótese de que a ivermectina poderia bloquear o coronavírus, o que não se confirmou. "Vimos grande ideologização da ivermectina no nosso País, e também nos EUA. Hoje, no Brasil, isso reduziu muito, mas nos Estados Unidos continua muito intensa", diz o pesquisador.

A motivação para ir atrás desses resultados, explica Reis, partiu também de uma inquietação por um remédio para combater a doença. "O mundo está numa corrida contra o tempo na tentativa de encontrar terapêuticas para a covid."

Conduzido em pacientes da rede pública, o estudo contou com o auxílio de prefeitos e secretários de Saúde. Para dar consistência à parte metodológica, teve apoio ainda de pesquisadores de universidades como a McMaster, do Canadá, e a Stanford, nos Estados Unidos. 

Conclusão

Voluntários tiveram resultados piores do que os do grupo placebo em Minas Gerais