Título: Magnífico
Autor: Tom Heneghan
Fonte: Jornal do Brasil, 09/04/2005, Internacional, p. A7

'Pela primeira vez na história, um pai universal para todo o mundo'

O Catolicismo Romano nunca pareceu tão universal ¿ o significado original da palavra ¿católico¿ ¿ como quando da homenagem final ontem ao papa João Paulo II, um dos gigantes da história de quase 2000 anos da Igreja. A cerimônia do funeral na basílica de São Pedro foi essencialmente romana, com os cânticos entoados na língua ancestral da cidade, o latim, e rituais desenvolvidos no Vaticano ao longo de séculos de celebrações religiosas.

Agora mais do que nunca, a mensagem do papa alcançou Urbi et Orbi (a cidade e o mundo), tanto a todos os países como a todas as crenças representadas no funeral e as centenas de milhares de pessoas que acompanharam a cerimônia pela TV ao redor do globo.

¿ João Paulo II, pela primeira vez na história, é realmente um pai universal para todo o mundo ¿ afirmou o cardeal belga Godfried Danneels, sobre o quão global o pontífice conseguiu transformar seu papado.

O papa polonês redefiniu o ministério de São Pedro, o primeiro a fazer isso na linhagem de 264 papas da maior igreja do mundo, direcionando-o ¿não só à Igreja Católica Romana, mas ao mundo¿, frisou o cardeal de Londres, Cormac Murphy-O'Connor.

A mescla de pessoas que atenderam ao funeral refletiu o alcance global. As bandeiras na praça São Pedro representavam da Polônia ao México, de Taiwan ao Líbano. As orações foram feitas em voz alta em 10 línguas, entre elas em espanhol, português, inglês, filipino e somali.

Líderes religiosos incluíram o chefe espiritual dos Católicos Ortodoxos, o patriarca ecumênico Bartholomeu, dos Anglicanos, o arcebispo de Canterbury Rowan Williams, e o secretário-geral do rabinado israelense, Oded Viner.

Toda uma gama de personalidades religiosas ¿ judias, muçulmanas, luteranas, metodistas, batistas, evangélicas, sikhs, budistas, hindus e outras ¿ atestaram o alcance de João Paulo II entre todas as crenças.

Do lado secular, cinco reis, seis rainhas e ao menos 70 presidentes e primeiro-ministros. Os muçulmanos foram especialmente proeminentes, com o comparecimento do rei da Jordânia, Abdullah, e dos presidentes iraniano, Mohamed Khatami, e afegão, Hamid Karzai.

A delegação dos EUA incluiu o presidente George Bush e os antecessores Bill Clinton e George Bush, pai. A Grã-Bretanha enviou o príncipe Charles e o primeiro-ministro Tony Blair.

¿De Bush a Khatami, o último milagre de Karol¿, destacou ontem o diário italiano La Stampa, em referência ao nome do pontífice.

No último maior funeral de um papa, o de Paulo VI, em 1978, a mulher do presidente Jimmy Carter, Rosalynn, liderou a delegação americana, enquanto a Grã-Bretanha foi representada pelo Duque de Norfolk, um dos raros católicos na extensa família real.

¿ A lista de convidados foi muito mais modesta para o funeral de Paulo VI, incluíam o arcebispo de Canterbury, uma pequena delegação do Conselho Mundial de Igrejas e pessoas da Igreja Protestante de Roma ¿ disse o especialista em Vaticano John-Peter Pham, da Universidade de Madison, na Virgínia. ¿ Qualquer judeu ou muçulmano presente não era proeminente.

A presença ortodoxa foi sem precedentes, disse, mesmo que a Igreja Ortodoxa da Rússia tenha enviado apenas uma autoridade.

¿ Até os anos 90, os ortodoxos costumavam se ausentar dos eventos se católicos da liturgia ocidental estivessem presentes ¿ afirmou.

Pham também observou que os 300 mil fiéis que lotaram a praça de São Pedro e arredores são prova da afinidade sem precedentes que João Paulo II tinha com os cidadãos comuns.

¿ Ele os colocou todos juntos, as pessoas comuns, os líderes políticos e os religiosos.

A presença ao último adeus do austero papa Paulo VI foi muito menor, em parte porque ele faleceu durante as férias de agosto.

¿ Os romanos não voltaram por Paulo, mas olhe quantos cruzaram a Europa por João Paulo ¿ comentou Pham.