Título: PF desmonta fraude de R$ 1 bilhão
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 12/04/2005, País, p. A3

Quadrilha presa tinha ramificações em vários estados e negociava créditos tributários frios para empresários em dificuldade

A Polícia Federal prendeu ontem uma quadrilha de 13 pessoas, acusadas de lavagem de dinheiro e de fraudar R$ 1 bilhão da Receita Federal. O grupo era encabeçado pelo argentino César de La Cruz Mendoza Arrieta e por Roberto Coimbra Fabrim e negociava créditos tributários ''frios'' ou não-habilitados com empresários em dificuldade financeira.

Os créditos eram usados para pagar tributos. Foram presos empresários, advogados e contadores envolvidos com o esquema fraudulento em São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Paraíba, Rio Grande do Sul e Tocantins.

A Operação Tango mobilizou 300 policiais para realizar as prisões e fazer 27 ações de busca e apreensão. O argentino César de La Cruz Mendoza Arrieta, um dos cabeças da quadrilha é um velho conhecido da Polícia Federal, apontado por uma CPI e outras investigações da PF como um dos maiores fraudadores do INSS. Arrieta foi preso em Porto Alegre junto com sua mulher, a advogada Sônia Regina Soder, e o empresário Roberto Coimbra Fabbrin, sócio de Márcio Pavan na venda de créditos para o Banco Santos.

Segundo o chefe do Núcleo de Repressão a Crimes Financeiros e Lavagem de Dinheiro da Superintendência da Polícia Federal no Rio Grande do Sul, delegado Alexandre Isbarrola, a quadrilha de Arrieta estaria fraudando o sistema financeiro e os dados da Receita desde 1997.

No Rio de Janeiro, foram detidos o advogado Paulo Renato Telles Primo e Siegfred Waldemar Max Franz Griesbranch, envolvidos com a quadrilha. Em São Paulo, a PF prendeu os empresários Rene Cabral, Marcelo de Oliveira Batista, Ricardo Augusto Godoy e Márcio José Pavan.

Segundo um dos agentes que acompanharam a operação, somente em uma das casas da quadrilha, em Cotia (SP), que pertenceria a Márcio, foram apreendidos três carros Mercedes-Benz, um Porsche Boxter e uma Cherokee. Também foi apreendido um avião Citation que o empresário comprou de uma famosa dupla caipira de Goiás.

Na Paraíba, foi preso Fábio Magno de Araújo Fernandes, responsável pelo agenciamento de clientes e fornecimento de certidões frias. Em Brasília, foram presos o contador Luis Carlos Abadie, a advogada Rosa Maria Habibe, que seriam os responsáveis pela contabilidade e defesa da quadrilha, além de Levi Soares, que emitia certidões frias.

Somente num período de seis meses do ano passado, a quadrilha movimentou R$ 1,5 bilhão em fraudes contra o sistema financeiro, lucrando pelo menos R$ 150 milhões. O golpe consistia na criação de créditos tributários ''frios'', oferecidos a empresas com dificuldades financeiras.

Os créditos eram utilizados em compensações de obrigações fiscais. A quadrilha também ''comprava'' investimentos como CDB's de investidores e não recolhia o Imposto de Renda ao baixar os valores.

Para concretizar os golpes, a quadrilha recorria a empresas como a Vale Couros Trading, comprada pelo Banco Santos, que sofreu intervenção do Banco Central. A organização criminosa pretendia utilizar créditos tributários no valor de R$ 436 milhões da Vale Couros Trading, com o objetivo de tentar afastar a então ameaça de intervenção do Banco Central.

Se uma empresa precisava pagar dívidas, a Vale Couros vendia compensações de créditos tributários, oriundos de IPI. Os créditos utilizados não poderiam ser negociados, pois são objeto de discussão na Justiça.

A PF investiga o envolvimento de funcionários da Receita e de alguns bancos com a quadrilha. Arieta e seu grupo compravam certidões negativas junto à Receita Federal para legalizar a situação de empresas envolvidas com fraudes e dificuldades financeiras.

- Eles conseguiam certidões frias para empresas com débitos - confirma o delegado Isbarrola.

Segundo o delegado Isbarrola, a próxima etapa da investigação é identificar todos os servidores da Receita Federal e os funcionários de bancos envolvidos com a quadrilha. Segundo o delegado, há envolvimento de servidores da Receita ''em Estados do Sudeste e do Nordeste''. Ele prefere não divulgar os nomes dos Estados, para não causar constrangimento no serviço público até o fim das investigações.

A investigação do Núcleo de Repressão a Crimes Financeiros e Lavagem de Dinheiro da Polícia Federal no Rio Grande do Sul começou em 2002, em Santa Maria. Os participantes do esquema são acusados de crime contra o sistema financeiro e formação de quadrilha. A ação da Polícia Federal foi batizada de Operação Tango, numa referência à relação entre os nomes do líder do grupo de fraudadores, César Arrieta, e o do compositor argentino Mario César Arrieta.