Título: ''Cometi um erro e corrigi''
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 12/04/2005, País, p. A5

Entrevista: Geraldo Mesquita

Às vésperas de entrar em votação na Câmara a proposta de emenda constitucional que acaba com o nepotismo nos três poderes da União, o senador Geraldo Mesquita (AC) quer passar uma borracha nesse assunto. Recém-chegado à legenda dos radicais, o PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), o senador ganhou notoriedade na semana passada por demitir 12 funcionários de seu gabinete, depois da denúncia de que havia contratado parentes. Feito isso, o parlamentar parte agora para outros planos políticos com a sensação do dever cumprido. ¿Lá no meu estado, as pessoas sabem que cometi um erro, um equívoco que corrigi. A maioria da população sabe que não sou safado¿, afirma. Embora resista em admitir, seus planos incluem possivelmente a disputa pelo governo do Acre, enfrentando a virtual candidata do PT, a ministra Marina Silva. Geraldo fala da decepção com o PSB, seu ex-partido, que, segundo ele, ajudou a jogar para debaixo do tapete a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigaria a questão dos grampos na Bahia, envolvendo a figura do senador Antônio Carlos Magalhães. Considera o PSOL o partido mais indicado para promover as transformações necessárias para o país e compara a senadora Heloísa Helena a uma rapadura: doce e dura. ¿ O senhor considera encerrado o assunto nepotismo?

¿ Sim. Demiti as pessoas. Cometi um erro e peço desculpas. Não foi por maldade. O fato está superado e o povo do meu estado entenderá minhas razões.

¿ O que o atraiu para o PSOL, partido com a marca do radicalismo?

¿ Minha opção pelo partido não foi de qualquer jeito. Estou há dois anos e meio no Senado, machucado, doído, não tenho prazer algum. Estava muito decepcionado com o meu partido, o PSB e a Frente Popular que me elegeu. Escolhi o PSOL porque acredito ele que é o instrumento político que pode, ao lado da população, fazer transformações importantes no país. Não é pitoresco. As pessoas já estão enxergando a sua importância. A senadora Heloísa Helena é uma pessoa que tem também papel importante e sempre a admirei. Sabia também da presença do Milton Temer no PSOL, que para mim sempre foi uma referência

¿ O que o decepcionou tanto?

¿ Fui eleito, cheguei no Congresso e a primeira experiência mais intensa que tive lá foi como relator na Comissão de Ética, indicado pelo senador Tião Viana (então líder do PT do Senado). Eu dizia que era uma coisa relativamente simples porque, como procurador da Fazenda, era muito usado para presidir processos administrativos disciplinares. O Tião me perguntava: ¿Geraldo, se a coisa se encaminha para você, você segura as pontas¿. Eu dizia, ¿claro¿. Pedi para formular um plano de ação mas Tião me disse que a linha não era para ser aquela. Então, entendi que a intenção do PT, já naquele instante, era de engavetar o caso, com o argumento de já havia inquérito aberto para isso. O meu partido, o PSB, apoiava aquilo.

¿ Como foi sua saída da Frente Popular do Acre?

¿ A oposição tentou me chamar de traidor. Mas não sou. É de praxe, quando se tem dois candidatos, os partidos conversarem, dizerem que você será o candidato à segunda vaga, mas se eleito tem que cumprir determinadas coisas. Comigo não foi assim, tal era a certeza de que nós elegeríamos a Marina Silva. Se eles soubessem que ganharíamos também a segunda vaga, o candidato não seria eu. Mas os compromissos que entendo que tinha dentro da Frente Popular foram aqueles que acumulamos ao logo do tempo. São compromissos que ninguém precisa cobrar. O desenvolvimento da nossa terra, com a prática política séria.

¿ O senhor sofreu mais algum tipo de pressão?

¿ Cheguei a dizer se estivesse incomodando que pegassem de volta o meu mandato e convocassem o meu suplente. Passei muito tempo por mentiroso na minha terra em função do próprio governador do estado, Jorge Viana (PT). Na votação do salário-mínimo, por exemplo, ele veio tentar me convencer de que o caminho não era aquele, pedindo para eu apoiar o presidente Lula. Propôs que nós dois fôssemos ao encontro do Lula dizendo que ele precisava de uma pessoa com meu perfil para colocar no Tribunal Superior. Aí, o negócio fechou na minha cabeça. Divergir do salário-mínimo, da reforma do Judiciário, foi uma coisa que me doeu. Nem o Fernando Henrique teve a ousadia de propor o que o Lula propôs na nova Lei de Falência. Votei contra a blindagem do Meirelles (Henrique Meirelles, presidente do Banco Central). Votei contra o valor do salário mínimo, que foi uma injustiça.

¿ O eleitor vai entender o senhor disputar o governo do Acre com Marina Silva a quem já apoiou?

¿ Espero que entenda. Ao sair do meu partido tive a dignidade de ligar a um por um para explicar as razões. E, para o meu contínuo desencanto, disseram que foram pegos de surpresa. Ora, eu me permito divergir, apontar falhas da Frente. Tivemos dois governos erráticos que se desviaram dos seus propósitos, traíram as expectativas do povo acreano e do povo brasileiro.