Correio Braziliense, n. 21387, 06/10/2021. Política, p. 3

Explicações ao Congresso

Cristiane Noberto


O Senado convidou, ontem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a prestarem esclarecimentos sobre as empresas que mantêm em paraísos fiscais — conforme foi trazido à tona no levantamento realizado pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ em inglês). Inicialmemente convocados, foram chamados por meio de requerimentos aprovados nas comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Fiscalização e Controle (CTFC). Eles deverão comparecer para falar das offshores no próximo dia 19 — dia em que também será lido o relatório final da CPI da Covid, sob elaboração do Renan Calheiros (MDB-AL).

Da mesma forma que no Senado, a Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou a convocação de Guedes para explicar suas movimentações financeiras no exterior. Por ser convocação, o ministro terá de comparecer à audiência, que ainda terá a data definida. A ausência sem justificativa seria crime de responsabilidade.

Na CFTC, o Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do pedido, se disse “espantado” pelo fato de a Comissão de Ética Pública da Presidência da República não ter identificado irregularidades por terem Guedes e Campos Neto empresas em paraísos fiscais. “O problema é a incompatibilidade da autoridade monetária e da autoridade da política econômica, que têm responsabilidade sobre o preço do dólar, terem movimentações no exterior. Para mim, isso não é ético, não é moral, e mostra um gravíssimo conflito de interesses. Principalmente diante do descontrole inflacionário que vivemos no país, e uma das causas disso está sendo a desvalorização da nossa moeda”, cobrou.

Na CAE, a proposta para o comparecimento do ministro foi apresentada pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jean Paul Prates (PT-RN). Contudo, foi estendida para Campos Neto. Para o senador por Sergipe, trata-se de um “desrespeito” as principais autoridades da economia do país terem empresas em paraísos fiscais.

“Imagine o brasileiro acordar com a manchete de que o presidente da Petrobras é dono de posto de gasolina. É mais ou menos isso: a política econômica deste governo fez com o que o patrimônio no exterior do ministro da economia mais do que dobrasse. Mesmo que possa não haver ilegalidade, seguramente temos um conflito de interesse”, observou.

Desgaste

Apesar de ter sido contrário à convocação, alegando que “desgasta” a imagem do governo, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) afirmou que Guedes e Campos Neto não têm “nada a esconder”. “É um requerimento para causar mais confusão. Acho muito ruim quando se tenta usar um palanque importante como a CAE para desgastar o governo. Isso impacta a cotação do dólar, a bolsa de valores e a confiança de investidores internacionais, que ficam preocupados com a instabilidade política”, disse.

Para Fernando Bezerra (MDB-PE), líder de governo no Senado, os dois já esclareceram o episódio por meio de notas. Contudo, o senador votou a favor do convite na CAE.

“Essas contas foram devidamente informadas na sabatina do presidente do Banco Central. O ministro da Economia informou à Comissão de Ética da Presidência da República. Os dois reiteram que desde a posse não fizeram qualquer movimentação ou transferência de recursos para o exterior, e estão dispostos a prestar essas informações”, garantiu.

Os advogados de Guedes divulgaram nota sobre a ida do ministro ao Senado. “A defesa do ministro Paulo Guedes irá protocolar, de forma voluntária, petição à PGR e ao STF esclarecendo de forma definitiva que o ministro jamais atuou ou se posicionou de forma a colidir interesses públicos com privados. (…) Reitera-se que toda a documentação e informação pessoal do ministro foi enviada à Comissão de Ética Pública e demais órgãos competentes, no início do mandato, os quais jamais viram qualquer conflito com o exercício do cargo.”

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