O Globo, n. 31508, 12/11/2019. Economia, p. 27

Novos contratos
Manoel Ventura
Geralda Doca
Renata Vieira


O presidente Jair Bolsonaro lançou ontem um pacote de medidas para incentivar a criação de empregos com carteira assinada, num momento em que o trabalho informal atinge o maior patamar já registrado e 12,5 milhões de pessoas ainda estão à procura de uma vaga, segundo o IBGE. A meta é alcançar a marca de quatro milhões de novos postos formais nos próximos anos. A parte mais importante do pacote busca gerar o primeiro emprego para os mais jovens, mas terá como forma de financiamento recursos dos brasileiros que estão sem trabalho, por meio da taxação do seguro desemprego.

Por falta de recursos, o governo retirou na última hora a concessão de benefícios para a contratação de pessoas acima de 55 anos.

— O mercado mudou, mas não vamos ser irresponsáveis. Estamos propondo um piloto para os jovens entre 18 e 29 anos, grupo em que o índice de desemprego é o dobro. Eles têm menor qualificação e menos experiência. Estamos apontando a contrapartida dentro do Orçamento para não haver desequilíbrio fiscal — explicou o secretário de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho.

Chamado pelo governo de Emprego Verde-Amarelo, o programa cria uma nova modalidade de contratação para as empresas que quiserem dar o primeiro emprego para jovens entre 18 e 29 anos. Em troca, elas terão redução de 30% a 34% nos encargos trabalhistas. A medida é restrita a contratos com duração de 24 meses, sendo permitida a contratação até dezembro de 2022, quando termina o mandato de Bolsonaro.

A meta é criar 1,8 milhão de empregos para essa faixa etária. A remuneração não poderá ser superior a 1,5 salário mínimo (hoje, R$ 1.497).

Se, de um lado, os empregadores vão ter o custo trabalhista reduzido, de outro, os trabalhadores vão ganhar menos. A alíquota do FGTS cairá de 8% para 2%. A multa de 40% sobre o saldo do Fundo nas demissões sem justa causa cairá à metade — nesse caso, mediante negociação entre empresa e empregado.

O programa vai custar R$ 10 bilhões em cinco anos, segundo o Ministério da Economia. Para compensar a redução de encargos para as empresas, o governo resolveu cobrar imposto de 7,5% sobre o seguro desemprego. Nos cinco anos, a expectativa é de uma arrecadação de R$ 11 bilhões a R$ 12 bilhões. Como compensação, o tempo que o trabalhador recebe o benefício passa a contar para o cálculo do INSS.

Hoje, quem recebe o auxílio não paga contribuição previdenciária, o que passará a ocorrer com a vigência do pacote. Ao ser indagado se os desempregados vão pagar a conta do programa Verde-Amarelo, Marinho respondeu que não. O argumento dele é que o beneficiário do seguro-desemprego poderá contar o tempo de recebimento do auxílio para fins de aposentaria. Atualmente, ele não pode e tem que recorrer à Justiça para fazer a incorporação.

O governo pretendia incluir pessoas com mais de 55 anos na nova modalidade de contratação, mas recuou. Marinho disse que o programa é piloto e não haveria dinheiro para compensar a inclusão dessa faixa:

— Nossa ideia era abranger pessoas com mais de 55 anos. Só que, quando fizemos os cálculos, tivemos que fazer uma opção. E optamos por aquele grupo da sociedade que é mais fragilizado.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem como meta fazer uma ampla redução na folha de pagamentos das empresas, com o objetivo de gerar empregos. Ele quer usar esse programa como embrião da desoneração, que ainda precisa de fonte de recursos para compensação. Se o projeto der certo, ele deve ser ampliado. Guedes e Bolsonaro não discursaram durante a cerimônia de lançamento do Emprego Verde-Amarelo, no Palácio do Planalto.

A maior parte das medidas precisará passar pelo Congresso Nacional, por meio de uma medida provisória (MP) e de dois projetos de lei.

O pacote traz ainda outras medidas para incentivar a geração de vagas formais de trabalho. Uma delas é a proposta do governo de liberar o trabalho aos domingos e feriados. Segundo o Ministério da Economia, 75% da indústria não possuem acordos coletivos para abertura nesses dias. Quando houver trabalho nesses momentos, o empregado tem direito ao seu repouso semanal remunerado compensatório em qualquer outro dia da mesma semana.

A MP inclui a possibilidade de trabalho aos domingos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com a ressalva de que, para os estabelecimentos do comércio, deverá ser observada a legislação local. O governo pretende, com isso, gerar 500 mil empregos na indústria e varejo até dezembro de 2022.

O governo quer ainda reinserir profissionalmente vítimas de acidente do trabalho, acidentes de qualquer natureza ou pessoas que estejam fora do mercado de trabalho decorrente de incapacidade. E vai apertar a fiscalização para os empregadores cumprirem a cota de 5% do quadro de pessoal para pessoas com deficiência. O objetivo, nesse caso, é colocar 1,25 milhão de pessoas no mercado de trabalho.

Dívida com correção menor

Há também proposta para incentivar microempreendedores da baixa renda terem mais acesso ao crédito. A meta é fechar 10 milhões de contratos, somando R$ 40 bilhões em créditos até 2022, com meta de gerar 450 mil empregos.

O Ministério da Economia propôs também reduzir a correção de ações trabalhistas pela metade. Os valores devidos por uma empresa (desde FGTS até horas extras, entre outras dívidas com o trabalhador) são hoje atualizados pelo indicador IPCA-E (baseado na inflação oficial) mais 12% ao ano. O governo quer manter o índice de inflação, mas alterar o segundo componente para o rendimento da poupança. O governo estima uma economia de R$ 37 bilhões para as estatais em cinco anos, com a nova correção, que valerá para todas as empresas.

As medidas de ontem também incluem um decreto que estabelece a nova política de qualificação profissional do governo, para formar dois milhões de trabalhadores, entre empregados e desempregados. O trabalho será feito por empresas privadas e por entidades do Sistema S.

“Nossa ideia era abranger pessoas com mais de 55 anos. Só que, quando fizemos os cálculos, tivemos que fazer uma opção. E optamos por aquele grupo da sociedade que é mais fragilizado”

Rogério Marinho, secretário de Previdência e Trabalho

Os principais pontos da proposta

Emprego verde-amarelo

Para jovens entre 18 e 29 anos. Contratos com duração de 24 meses, sendo permitida a admissão até dezembro de 2022. A remuneração não poderá ser superior a 1,5 salário mínimo (hoje, o equivalente a R$ 1.497). As empresas terão redução de até 34% nos encargos trabalhistas. A alíquota do FGTS cairá de 8% para 2%, e a multa de 40% sobre o saldo do Fundo nas demissões sem justa causa cairá à metade — nesse caso, mediante negociação entre empresas e empregados antes da contratação.

Trabalho aos domingos e feriados

A MP inclui a possibilidade de trabalho aos domingos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com a ressalva de que, para os estabelecimentos do comércio, deverá ser observada a legislação local. Quando houver trabalho nesses dias, o empregado tem direito a repouso semanal remunerado em qualquer outro dia da mesma semana.

Novo índice de reajuste de débitos trabalhistas

Os valores devidos por uma empresa (desde FGTS até horas extras, entre outras dívidas com o trabalhador) são hoje atualizados pelo indicador IPCA-E (baseado na inflação oficial) mais 12% ao ano. O governo propôs manter o índice de inflação, mas alterar o segundo componente para os juros da poupança.

Novas regras para fiscalização do trabalho e multa

Em vez de centenas de tipos de multas, serão estabelecidos quatro níveis: leve, médio, grave e gravíssimo, com variações de acordo com o número de empregados e faturamento. Serão sete centrais regionais de fiscalização. A primeira visita do fiscal ao estabelecimento não gerará multa, mas advertência,oferecendo a possibilidade de regularização. A multa só será aplicada em caso de reincidência.

Reabilitação

A medida prevê reabilitação física e habilitação profissional para reinserir vítimas de acidente do trabalho, acidentes de qualquer natureza ou pessoas que estejam fora do mercado de trabalho decorrente de incapacidade.

Microcrédito

A fim de contemplar microempreendedores da baixa renda, o governo pretende aumentar o acesso ao microcrédito, incentivando bancos, fintechs, agências de fomento e cooperativas de crédito a investirem nesse mercado.

Depósitos recursais trabalhistas

A reforma trabalhista permitiu a substituição do depósito recursal de uma ação trabalhista por fiança bancária (quando o dinheiro não fica parado no banco). Mas isso não ocorreu de forma retroativa. Agora, o governo propôs liberar os depósitos já feitos com substituição por fiança ou seguro garantia.

Cotas para contratação de pessoas com deficiência

O governo vai obrigar os empregadores a cumprirem a cota (de 5% do quadro de pessoal) para pessoas com deficiência. Será permitido acordo entre empresas para compensação de cota. Pessoas com deficiência severa contarão em dobro para o preenchimento de vagas.

Gorjeta

O texto deixa claro que gorjeta não é receita do empregador, mas do funcionário.