O Globo, n. 31537, 11/12/2019. País, p. 8

Dois tempos
Gustavo Maia
Isabella Macedo
Bruno Góes


Em um acordo costurado entre a noite de segunda feira e a madrugada de ontem, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deu parecer favorável ao pacote anticrime, o que permitirá a votação do texto em plenário hoje, apenas uma semana depois de a Câmara aprová-lo. A celeridade na tramitação das mudanças na legislação penal, no entanto, envolveu outro acerto: a cúpula do Congresso conseguiu empurrar uma decisão sobre a prisão imediata de condenados em segunda instância para o ano que vem.

A CCJ do Senado também aprovou ontem projeto de lei que permite a execução da pena depois de sentença em segunda instância. O aparente avanço, porém, esbarra na resistência dos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em deliberar sobre o assunto depois da decisão do Supremo que derrubou a possibilidade de prisão em segunda instância. No acordo para aprovar o pacote anticrime no Senado ainda esta semana, Alcolumbre acertou que o grupo chamado de lava-jatista concorde que a decisão final sobre o projeto sobre o momento da prisão de condenados fique para 2020.

O presidente do Senado insistiu ontem que o melhor caminho para o assunto é por meio da proposta de emenda à Constituição (PEC) que tramita na Câmara:

— Não vai votar (este ano). Esse foi um acordo construído. O presidente da Câmara estabeleceu calendário de votação da PEC (março de 2020). Sempre falei que, por meio desse projeto de lei (do Senado), pode haver questionamento judicial. Continuo com compreensão de que é importante nós votarmos a PEC na Câmara.

O projeto em discussão no Senado precisa passar por mais um turno na CCJ, o que está marcado para hoje. Depois, poderia seguir direto para a Câmara. Mas o PT já antecipou que apresentará recurso para que ele seja debatido também no plenário.

A decisão de não votar o texto este ano teve a anuência também de senadores lava-jatistas, que consideraram uma vitória a garantia da aprovação do pacote anticrime. Além disso, concluíram que não seria estratégico mandar o texto da prisão para a Câmara esta semana. Isso porque Maia não o pautaria, alegando falta de tempo antes do recesso. Com esse cenário, mantendo o texto no Senado, o grupo garante pelo menos um instrumento de pressão política para que o assunto ande ano que vem. Se a Câmara não avançar na PEC, esses senadores vão voltara apelar pela aprovação do projeto no Senado.

Maia negou ontem que haja manobras para protelara aprovação do retorno da prisão em segunda instância.

— Para quem não quer dar solução era só votara P EC que tratava do Artigo 5º (da Constituição). Claro que ia bater no Supremo, ia dar in constitucionalidade .(...) Na minha gestão, não vai ter pela primeira vez na história desde a redemocratização a aprovação de uma PEC que muda uma cláusula pétrea — disse Maiano Ao Ponto,podcast diário do GLOBO, em referência a um texto derrubado pela CCJ da Câmara.

Anticrime

O pacote anticrime foi aprovado, em votação simbólica, com o mesmo texto que saiu da Câmara na semana passada. Entre as propostas iniciais do ministro da Justiça, Sergio Moro, um dos pontos rejeitados foi a mudança do conceito de legítima defesa. Na iniciativa de Moro, havia alteração no Código Penal para beneficiar agentes públicos. O juiz poderia “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” se o excesso em ações de autoridades decorresse “de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

A proposta estabelece mudanças em leis que tratam de temas relacionados à segurança pública. Determina, por exemplo, o aumento do tempo máximo de cumprimento de pena de 30 para 40 anos. O projeto prevê ainda que chefes de organizações criminosas comecem a cumprir pena obrigatoriamente em presídios federais. Se aprovado no plenário hoje, o texto segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro.

Congresso e governo discutem fundo de R$ 2,5 bilhões 

Após pressão do Palácio do Planalto, o Congresso Nacional deve aprovar no Orçamento o valor de R$ 2,5 bilhões para o fundo eleitoral que financiará as campanhas no ano quem vem. A proposta de líderes partidários do centrão, incluída no relator do projeto de lei Orçamentária, Domingos Netos (PSD-CE), era de R$ 3,8 bilhões para o fundo, mas emissários do governo sinalizaram um veto do presidente Jair Bolsonaro se esse for o montante aprovado.

Em agosto, na primeira versão que encaminhou o Congresso, o governo previu R$ 2,5 bilhões para o fundo. Há duas semanas, no entanto, o Executivo alterou sua proposta para uma previsão de R$ 2 bilhões. Para que o acordo seja selado, parlamentares querem o compromisso do governo de que não haverá qualquer veto. Além da pressão do Planalto, há por parte dos parlamentares o reconhecimento de que o aumento do fundo gera desgaste e é uma pauta impopular.

Também pesaram para convencer os partidos do centrão as recentes derrotas do grupo na votação de vetos presidenciais à lei que trata de eleições e regras partidárias. O Senado manteve o veto de Bolsonaro e impediu a recriação da propaganda partidária fora do período eleitoral. Já a Câmara manteve a proibição de pagamento de multas aplicadas às legendas com dinheiro do fundo partidário.

Sem Eduardo

Sem a presença da ala ligada ao presidente Jair Bolsonaro, deputados do PSL decidiram ontem indicar Joice Hasselmann (SP) para substituir Eduardo Bolsonaro (SP) na liderança da bancada.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), reconheceu na noite de ontem a suspensão de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e mais 13 parlamentares das atividades partidárias do PSL. Com isso, Eduardo já está automaticamente destituído da liderança do partido da Câmara. Joice Hasselmann, por sua vez, deve assumir o cargo.