O Globo, n.31.622, 05/03/2020. Sociedade. p.36

Brasil resiste a seguir modelo chinês contra vírus

André de Souza


O Ministério da Saúde anunciou ontem a identificação de mais dois casos do novo coronavírus (Sars-CoV-2) no Brasil —um deles já confirmado e o outro, aguardando a contraprova, até o início da noite. Assim como nas duas primeiras confirmações, os pacientes moram em São Paulo e estiveram na Europa há pouco tempo.

O novo caso que já teve seu diagnóstico positivo reconhecido é de um administrador de empresas colombiano de 46 anos, residente em São Paulo. Em 9 de fevereiro, ele foi para a Espanha e, na sequência, para Itália, Áustria e Alemanha, retornando ao Brasil no último dia 29.

O administrador foi atendido ontem no Hospital Albert Einstein, apresentando sintomas de Covid-19 —tosse, dor de garganta, dor de cabeça, dores musculares e coriza —, foi testado e o resultado deu positivo. Como o hospital já havia feito a confirmação inicial dos dois primeiros casos registrados no país —homens, de 61 e 32 anos—, o Ministério da Saúde dispensou a contraprova para confirmar o novo caso.

O quarto caso, que aguardava contraprova do Instituto Adolfo Lutz (em São Paulo), é de uma adolescente de 13 anos que passou por Portugal e chegou à Itália em 22 de fevereiro. Lá, foi internada em um hospital nas Dolomitas, região dos Alpes italianos, no Norte do país, para tratar de uma lesão.

No último domingo, ela retornou ao Brasil e, na segunda-feira, foi ao Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo. Mesmo sem apresentar sintomas, fez o teste para o novo coronavírus em um laboratório particular, e o primeiro resultado deu positivo. Sua família também será monitorada.

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, disse que o fato de a adolescente ter testado positivo mesmo assintomática não vai alterar os critérios para definir casos suspeitos.

—Foi um acoleta for ad acurva. Para a saúde pública, agente continua( contabilizando) como caso suspeito somente quem tem sintoma. Não vamos fazer exame em todo mundo, uma loteria esportiva.

O ministério atualizou ontem o número de casos em investigação no Brasil e, como esperado —por conta do aumento do escopo da lista de alerta, que atualmente inclui 33 países—, ele continua em elevação: há 531 casos suspeitos, a maioria deles (136) em SP.

Em seguida vêm Minas Gerais (82), Rio Grande do Sul (98), Rio de Janeiro (55) e Santa Catarina (46). Apenas cinco estados não estão na lista: Maranhão (que chegou a ter duas suspeitas, descartadas), Acre, Tocantins, Amapá e Roraima.

Mandetta reconheceu que a situação no país deve piorar, incluindo o registro de mortes por causa do vírus, mas que isso não será motivo para alarde.

— Vai estressar o sistema de saúde? Provavelmente sim. Teremos dias bons, dias ruins? Provavelmente sim. Se tivermos no Brasil um cenário daqueles (de epidemia), vamos perder pessoas? É possível, está acontecendo no mundo. Agora, calma, porque a gente vai atravessar como já atravessamos outras situações como essa —disse Mandetta.

O ministro voltou a recomendar que sejam evitadas viagens a locais onde há transmissão registrada do vírus. Também pediu que pessoas com sintomas e que tenham viajado ao exterior se coloquem, por iniciativa própria, em isolamento em casa, e depois se encaminhem a uma unidade de saúde. Ele negou que seja necessário isolamento domiciliar para quem não tem sintomas.

FIOCRUZ ENVIA KITS

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) iniciou ontem a distribuição de kits para diagnóstico do novo coronavírus, enviados à rede de laboratórios públicos do país.

A primeira fase da produção inclui insumos para a realização de 30 mil testes, que revelam o resultado em cerca de se is horas. O objetivo é des centralizar os exames para acelerar oc om bate à Covid -19.

Os kits também permitirão detectar se os pacientes foram infectados pelos vírus influenza. Eles foram desenvolvidos pelos Institutos de Tecnologia em Imunobiológicos (BioManguinhos/Fiocruz) e de Biologia Molecular do Paraná.


Cientistas: explosão de Covid-19 foi causada por dois tipos de cepas


 

Cientistas na China que estudam a origem do surto do novo coronavírus afirmaram ter descoberto que dois tipos principais do vírus podem estar causando infecções. Os pesquisadores da Escola de Ciências da Vidada Universidade de Pequi medo Instituto Pasteur de Xangai, da Academia Chinesa de Ciências, alertaram, no entanto, que suas pesquisas examinaram uma gama limitada de dados e que serão necessárias análises mais complexas para entender mais da evolução do vírus.

O estudo preliminar descobriu que um tipo mais agressivo do novo coronavírus, associado ao surto de doença em Wuhan, representava cerca de 70% das cepas analisadas, enquanto 30% estavam ligadas a um tipo menos agressivo. Aindade acordo com os cientistas, a prevalência do vírus mais agressivo diminuiu após o início de janeiro de 2020.

“Essas descobertas apoiam fortemente uma necessidade urgente de mais estudos abrangentes e imediatos que combinem dados genômicos, dados epidemiológicos e registros dos sintomas clínicos de pacientes com doença por coronavírus 2019 (Covid-19)”, diz o estudo publicado na Academia Chinesa de Ciências.

A China teve 119 novos casos confirmados ontem, informou a Comissão Nacional de Saúde, um pouco abaixo dos 125 do dia anterior, em uma tendência de queda no número de novos casos. São, no total, 80.270 infectados e 2.981 mortes.