O Globo, n.31.621, 04/03/2020. Editoriais. p.2

Sindicalização na PM tem de ser combatida


O motim de policiais militares no Ceará chegou ao fim sem que fosse concedida uma inconcebível anistia. Mas aumentou o tamanho do problema que o Estado tem para descontaminar os quartéis da intoxicação que vem sendo causada por políticos em busca de votos num curral de eleitores armados.

O mais conhecido é o presidente da República, Jair Bolsonaro. Há outros, vários egressos da PM, que souberam usar de trampolim movimentos como este para entrar em Casas legislativas. Inclusive em Brasília.

Policiais em greve desrespeitam a Constituição, e mesmo assim governos vêm há tempos convivendo com atos ilegais, insuflados por sucessivas anistias, inclusive aprovadas no Congresso. O monstro foi cevado com essas concessões até atingir uma dimensão que assusta.

O motim no Ceará, em que policiais mascarados repetiram traficantes, ordenando o fechamento do comércio, não pode ser esquecido pelas autoridades. Deve servir-lhes de um forte alerta. Quando o próprio diretor da Força Nacional, convocada para atuar no estado, coronel Antônio Aginaldo de Oliveira, do Ceará, chama os soldados amotinados de"gigantes" e"corajosos ", algo vai muito mal no campo das hierarquias e do cumprimento da lei.

Achegada de Bolso na roa o Planalto parece ter aumentado a fermentação sindic alnos quartéis, que hoj eve em no Planalto um aliado. Percepção confirmada pela resistência do presidente da República a ampliara vigência do decreto de Garanti ada Lei e da Ordem (G LO) no Ceará. Ele terminou estendido em uma semana. M asem novedias de falta de policia mentonas ruas, houve 241 assassinatos.

O presidente disseque em seu governo as GLOsnã od ura rã oparas empre.E se for preciso mantê-las em vigor por um prazo longo, como no Rio de Janeiro, onde a intervenção federal teve de durar quase 11 meses? O seu novo ministro da Casa Civil, general Braga Net to, que comandou com eficiência a atuação das tropas na cidade e no estado, pode explicar-lhe a importância da GLO. Ficou muito visível a intenção do presidente da República de ficar ao lado dos amotinados, forçando o governador Camilo Santana, não por acaso do PT, a aceitar incabíveis reivindicações como a anistia. Que não foi concedida, felizmente.

Só mesmo apostura de Bolsonar o simpática à greve pode explicar o malabarismo do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, de confirmar que motim é ilegal, portanto, um crime, mas acrescentar que os policiais não eram criminosos. Tortuoso.

Surgiu de maneira mais clara um problema de alto potencial de gravidade: o Planalto já demonstrou que o seu principal inquilino se mantém na política rasteira do baixo clero, preocupado em atender as corporações que o apoiam. Mesmo indo contra a Constituição.

Com Bolsonaro no Planalto, os Poderes da República precisam estar atentos para exercer sua autonomia garantida na Constituição.